Para brasilianista, ajuste fiscal não ameaça ganhos sociais
Fundação Lemann/Bloomberg | ||
O professor Werner Baer, à direita, com Jorge Paulo Lemann, ao centro, e David Fleischer, à esquerda |
O brasilianista Werner Baer, professor de economia na universidade de Illinois (Estados Unidos), questiona o alarme em torno da valorização do dólar, que bateu o recorde de R$ 4,24, em setembro.
Segundo o americano, um câmbio a R$ 4,50 tornaria a indústria brasileira mais competitiva, estimularia as exportações, criaria empregos e inibiria a importação de bens manufaturados. "Mas é preciso parar de uma vez por todas com subsídios", sustenta.
Economista com passagens por universidades e institutos brasileiros, Baer. que prefere não informar a idade, ajudou a formular programas de pós-graduação no Brasil e é autor de diversos estudos sobre a economia nacional.
O professor defende austeridade, mesmo que "doa" e afirma que o sistema previdenciário é um "fardo" para o governo. O ajuste fiscal, argumenta, "não necessariamente" compromete a distribuição de renda, como petistas como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmam. "A classe média hoje recebe benefícios exagerados", aponta Baer.
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Folha - Como avaliar a atual política econômica?
Werner Baer - O PIB do Brasil deve cair 3%, a inflação se aproxima de dois dígitos e o desemprego está em alta, então, não parece boa, definitivamente.
O que deveria ser feito?
Algumas coisas têm que mudar. A Previdência Social, por exemplo. Os brasileiros hoje vivem mais e não deveriam poder se aposentar tão cedo. Isso é um grande fardo para o governo.
Certamente, é preciso fazer algo, de uma vez por todas, para parar com subsídios para algumas indústrias. Muita gente acha que é ruim o real se desvalorizar. Eu acho bom, porque o grande problema no Brasil é que, com a apreciação do real, a indústria se tornou menos competitiva. Com a desvalorização, há possibilidade de o Brasil aumentar sua produção industrial e as exportações.
Em qual patamar deveria estar o real?
As pessoas estão preocupadas até mesmo agora, que está perto de R$ 4. Acho que R$ 4,50 seria bom do ponto de vista da indústria, que se tornaria mais competitiva internacionalmente, as exportações aumentariam, criaria empregos, a importação de bens manufaturados ficaria mais cara, o que é bom apra estimular a indústria doméstica.
A cobrança de mais impostos como CPMF seriam uma solução?
Obviamente, o governo precisa achar formas de aumentar as receitas. O imposto sobre transações bancárias não é o mais eficiente, mas pode ajudar a curto prazo. Mas mais importante é assegurar que todos os contribuintes paguem impostos.
Quais serão as consequências do anúncio formal de deficit de R$ 52 bilhões neste ano?
O problema é que gastos como os com pensões precisam parar. Outro problema é que corte de gastos aprofundam a recessão e, com isso, diminui ainda mais a receita do governo [com queda na arrecadação. Você se livra de um deficit cortando gastos ou aumentando receita. Esse é o dilema em que o Brasil se encontra. Precisará cortar gastos sociais, que podem doer, mas podem também contribuir para se livrar do deficit.
Há riscos de aumentar a desigualdade?
Depende. A distribuição de renda melhorou nos últimos anos, não há dúvida. Mas há um problema, por exemplo, com o salário mínimo, que aumentou substancialmente. Pode ser bom, mas, por outro lado, outros gastos estão atrelados. Se o salário mínimo sobe, não significa um aumento apenas dos menores pagamentos, mas também gastos como as pensões. Torna as coisas muito difíceis.
O ajuste fiscal pode prejudicar mais os pobres?
Depende de quais gastos forem cortados. Você não quer cortar o Bolsa Família, mas sim as pensões de alguns beneficiários. O brasileiro, na média, se aposenta muito cedo, ainda que a expectativa de vida tenha aumentado substancialmente. Precisa criar uma idade mínima de aposentadoria.
Eu acho que cortar gastos sociais não significa necessariamente que vai recair sobre os pobres. A classe média recebe benefícios exagerados.
Concorda com a atuação do Banco Central para controlar a inflação, mantendo a taxa básica de juros a 14,25%?
A taxa de juros alta é um bom sinal no controle da inflação, mas, se for alta demais, atrai muito recurso de curto prazo, o que dificulta a contínua desvalorização do real, que, por sua vez, seria bom para a indústria.
Quando se pode esperar uma recuperação?
Graças a Deus, como professor, olho para trás, e não para ferente. Não faço previsões, mas, dada a situação atual, não acho que vá se recuperar no ano que vem. Se as medidas certas forem tomadas, em 2017, a queda vai parar e o Brasil voltará a crescer. Se o resto do mundo crescer, certamente, ajudará o Brasil a exportar manufaturas e alguns preços de commodities podem voltar a subir.
Um eventual impeachment da presidente Dilma Rousseff seria bom para a economia?
Não há nada que investidores estrangeiros detestem mais que incerteza. Eu, como "outsider", não vou julgar quem é e quem não é culpado, mas não há dúvida de que, enquanto a crise política, que é profunda, não for resolvida, a incerteza não desaparecerá e estrangeiros ficarão relutantes em fazer novos compromissos e investimentos no Brasil. O quanto antes se resolver a crise política, será melhor para retomar o crescimento econômico.
É possível recuperar a confiança?
A confiança volta facilmente. Uma vez que se estabilizar a situação política, investidores estrangeiros enxergarão os recursos do Brasil e as tremendas necessidades de investimento em infraestrutura. Acho que o Brasil está no caminho certo com os contratos de concessão.
O senhor diz que uma coisa que admira no Brasil é a alegria de seu povo. Ainda pensa assim?
Acho que a população brasileira é feliz mesmo quando sofre. Faz piadas, é irônica, tem uma atitude mais positiva do que a de muitos países.
Qual é o impacto da corrupção na economia?
Não estou defendendo a corrupção, mas, em certo volume, existe no mundo todo. As construções de empreiteiras, em qualquer parte do mundo, vão ser corrompidas em alguma extensão. Talvez a corrupção no Brasil tenha sido exagerada, mas, para mim, é positiva a atuação, por exemplo, da imprensa brasileira ao expor os aspectos negativos do governo. A liberdade de imprensa no Brasil talvez seja a maior da América Latina.
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- RAIO-X - WERNER BAER
> Professor de economia na universidade de Illinois
> Mestrado e doutorado pela Universidade Harvard
> Autor de "Economia Brasileira: Crescimento e Desenvolvimento"
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