É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.
Após o voto, a quarta agenda
Ganhe quem ganhe a eleição deste domingo no Brasil, terá que debruçar-se sobre o que o sempre instigante filósofo Renato Janine Ribeiro, professor de Filosofia Política na Universidade de São Paulo, chama de quarta agenda democrática.
A primeira agenda foi a queda da ditadura, que completa exatos 30 anos no ano em que começará o novo mandato presidencial.
A segunda foi a estabilização da economia, com o Plano Real, que fez 20 anos este 2014.
Por fim, veio o início da inclusão social, a grande marca deixada pelo governo Lula e mantida por Dilma Rousseff.
Vê-se, por essas agendas, como foi tremendamente positiva para o Brasil a plena vigência do regime democrático.
Mas, sempre segundo Ribeiro, só quando se completar a quarta agenda estará consumado o processo de conversão do Brasil em uma democracia que realmente funcione.
Qual é essa agenda? É a da qualidade dos serviços públicos em geral, particularmente transportes, educação, saúde e segurança pública - não por acaso a agenda das manifestações de rua de junho de 2013.
É significativo que outro intelectual instigante, Matias Spektor (Fundação Getúlio Vargas e colunista desta Folha), bata mais ou menos na mesma tecla, em artigo recente:
"Esta é uma campanha sobre serviços públicos. É uma queixa contra a degradação dos centros urbanos. É uma queixa contra a brutalidade policial. É sobre corrupção e o sentimento de que o sistema político em sua totalidade necessita uma grande restruturação".
Acrescento uma avaliação do colunista espanhol Antonio Navalón, que estende o olhar para todas as eleições latino-americanas, não apenas a brasileira, para concluir:
"A América busca a si mesma. Deseja encontrar o equilíbrio entre os modelos formais das democracias tradicionais e o grande desequilíbrio e a grande dúvida que pende sobre o futuro da América Latina: a desigualdade social".
Atacar essa ampla agenda é um tremendo desafio, que exige coragem e iniciativas dos governantes, ao contrário do que ocorreu no período de crescimento mundial iniciado em 2003.
Como aponta Ruchir Sharma, da Morgan Stanley, a crise de 2008 fez com que caísse de 60% para 30% a porcentagem de países que cresciam 5% ao ano ou mais.
Sharma comenta que, "quando os tempos eram bons, muitos líderes negligenciaram o esforço pelas reformas e por investir sabiamente os ganhos. Como consequência, suas nações lutam agora para sustentar o crescimento".
E acrescenta que o Brasil (além de Rússia e África do Sul) "viu sua taxa de crescimento desabar para cerca de 1% este ano e sua inflação subir para cerca de 6%".
Ou seja, o novo governo, seja qual for, terá que recuperar altos níveis de crescimento, fazer reformas que atendam os investidores mas também –e principalmente– cuidar da agenda imposta pela rua.
Livraria da Folha
- Coleção "Cinema Policial" reúne quatro filmes de grandes diretores
- Sociólogo discute transformações do século 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade