É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.
Plebiscito e votação para Constituinte definirão futuro da Venezuela
A Venezuela entra neste domingo (16) em um curto período (até o fim do mês) em que se vai verificar se o país atinge ou não um ponto de não retorno, analisam observadores sensatos e agudos.
O que acontece neste domingo? A oposição convocou um plebiscito destinado a aceitar ou rechaçar a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte pelo governo de Nicolás Maduro.
Juan Barreto/AFP | ||
Manifestantes seguram cartazes em defesa do plebiscito e contra a Constituinte na Venezuela |
Em tese, a rejeição está assegurada: pesquisa da respeitada Datanalisis mostra que 85% dos consultados consideram desnecessário reescrever a Constituição —elaborada, é bom lembrar, durante o reinado de Hugo Chávez, do qual Maduro é o herdeiro.
Reforça comunicado de um ator em tese neutro, a Conferência Episcopal: "A Assembleia Nacional Constituinte é questionada e rechaçada pela maioria do povo venezuelano".
Como toda ditadura teme votações populares, o governo tratou de preparar uma armadilha: convocou para o mesmo domingo uma espécie de treinamento para a eleição da Constituinte.
Haverá, então, dois públicos em movimento: um para votar no plebiscito da oposição e, outro, para "treinar" para a Constituinte, um pleito inepto porque não será feito com sufrágio universal e, sim, por um colégio desenhado à medida do governo.
É razoável imaginar que o público maior estará com a oposição, já que a Venezuela encontra-se em um pântano tremendo, muito maior do que o do Brasil.
A economia caminha para retroceder pelo terceiro ano consecutivo, para ficar 20,7% menor do que em 2014 —nível de queda só comparável ao de países em guerra. A inflação deve chegar a 1.700% este ano, 11,4% das crianças venezuelanas estão subnutridas e 10,5% da força de trabalho está desempregada.
Acrescente-se a esses números um índice recorde de homicídios e chega-se à conclusão exposta em recente manifesto de cerca de 60 intelectuais, membros da sociedade civil e representantes da mídia: trata-se da "maior crise econômica e social nos últimos cem anos de nossa história republicana".
Se a oposição não ganhar uma queda de braço nesse cenário, é melhor desistir de uma boa vez.
O governo não tem o saudável hábito de reconhecer a realidade, mas é possível que, se o número de votantes no plebiscito for de fato enorme, acabe aceitando o prosseguimento de um diálogo muito subterrâneo com a oposição já em andamento.
O alvo primeiro do diálogo não seria cancelar a convocação da Constituinte, pedido que a oposição faz diariamente (e o governo brasileiro endossa ), mas que teria custo insuportável para o governo.
Por isso, o que se imagina, para evitar atingir o ponto de não retorno, é o governo fazer a votação da Constituinte, no dia 30, mas não instalar a assembleia dela resultante por um tempo suficiente para permitir o aprofundamento do diálogo.
Mais que nunca, pois, a Venezuela merece toda a atenção do Brasil, país que é o segundo destino preferido dos venezuelanos que fogem do pântano: dos 52 mil venezuelanos que pediram asilo no primeiro semestre de 2017 (o dobro dos que o fizeram em todo o ano passado), 12.960 escolheram o Brasil.
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