É cientista político, especialista em política internacional e Oriente Médio e pesquisador da Universidade Harvard. Foi consultor da ONU.
Ausência de estratégia para América do Sul compromete ambições do Brasil
Um dos elementos básicos definidores do poder e do status de uma nação nas relações internacionais é a sua capacidade de influir ativamente em seu espaço geográfico imediato.
A ausência de uma estratégia objetiva e coerente para a América do Sul nos últimos anos vem permitido que forças externas ocupem o vácuo deixado pelo Brasil, delimitando a agenda da região e restringindo as opções internacionais do país. Sem uma base regional sólida, as aspirações do Estado brasileiro perdem tração nos múltiplos tabuleiros multilaterais, sobretudo, o pleito a um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU.
Um diagnóstico realista aponta para as seguintes constatações:
Enrique Marcarian - 17.dez.2014/Reuters | ||
A então presidente Dilma Rousseff (centro) participa de conferência do Mercosul na Argentina |
1) O Brasil não possui um projeto de desenvolvimento para a região consonante com sua suposta "liderança natural"; essa qualificação, aliás, reflete a incapacidade do país de estabelecer uma liderança efetiva e objetiva;
2) A China avança com investimentos sobre a América do Sul, ampliando seu poder sobre a região, preenchendo lacunas que deveriam ser ocupadas pelo Brasil e diluindo a influência de nosso país;
3) A ausência brasileira na mediação do processo de paz da Colômbia revela o grau de desprestígio de Brasília no desenrolar do principal tema de segurança sul-americana;
4) Suriname e Guiana parecem estranhos à configuração que a política externa brasileira confere à América do Sul. Somados a Bolívia, Equador e Venezuela, o número de nações que não compõem o baralho de Brasília é de cinco países, ou seja, quase metade da região;
5) A capacidade operacional da diplomacia nacional encontra-se reduzida ao Mercosul, bloco imerso em desfuncionalidade sistêmica;
6) Os EUA avançam gradualmente, aumentando sua influência sobre Paraguai e Suriname, além da Colômbia. E, habilmente, a diplomacia americana está restaurando sua influência na Venezuela;
7) A Aliança do Pacífico, que engloba três de nossos vizinhos –Colômbia, Peru e Chile– vai se desenvolvendo e se fortalecendo à margem da influência brasileira; e
8) A região vai se convertendo em arena de disputa comercial e política entre China e Estados Unidos, sob o olhar impávido do Brasil.
Uma constante histórica da diplomacia brasileira subsiste em buscar sempre navegar com zelo entre os países latino-americanos e, particularmente, no traçado fronteiriço sul-americano. A "natural liderança" brasileira é exercida mais pela capacidade de mediar conflitos regionais, de impulsionar iniciativas pontuais de integração econômica e pelo desinteresse de potências externas do que por um projeto consistente para a região.
Entretanto, a conjuntura –internacional e regional– mudou. Se o Brasil não renovar sua gramática política para a região, de forma ousada e assertiva, nossa atuação internacional será comprometida. Desde 2011, parece que o país perdeu a sua bússola estratégica para a região. Se o Brasil quiser alistar nossos vizinhos para suportar suas ambições globais, é preciso refletir sobre quais alternativas de desenvolvimento o país pode oferecer para a América do Sul.
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