Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e em Pequim. Na coluna, fala sobre relações internacionais, com atenção especial ao Oriente Médio. Escreve às segundas, a cada duas semanas.
A conexão israelo-saudita
Deu sinais de arrefecer, na última sexta-feira (28), a onda de violência delineada por atentados contra alvos israelenses e pelos protestos contra medidas de segurança implementadas, em Jerusalém, pelo premiê Binyamin Netanyahu.
Em vez de nova "intifada" (rebelião palestina), avança a aproximação entre Israel e líderes regionais, como Arábia Saudita e Egito, interessados na manutenção em baixa temperatura do conflito israelo-palestino, a fim de concentrar esforços contra um inimigo comum: o Irã.
Nos últimos anos, a complexa trajetória do Oriente Médio, esculpida por desavenças políticas, econômicas e religiosas, voltou a ser modelada sobretudo pelo enfrentamento entre dois campos.
De um lado, o regime teocrático do Irã, com o projeto de "exportar" a revolução islâmica, responsável por, em 1979, derrubar o governo do xá Reza Pahlevi. Aiatolás, líderes do ramo xiita do Islã, predominante em solo iraniano, falam em obliterar a influência dos EUA no Oriente Médio e defendem, sem meias palavras, a destruição de Israel.
Teerã coleciona ainda rivalidade histórica com Arábia Saudita, onde predomina a vertente sunita do islamismo. Seguidores de ramos diferente da mesma religião, iranianos e sauditas travam intenso duelo pela liderança no mundo muçulmano.
Na trágica guerra da Síria, por exemplo, enquanto o Irã apoia o regime de Bashar Al-Assad, a Arábia Saudita se alia a grupos rebeldes.
Um outro episódio recente a opor os rivais foi a crise do Qatar, pequeno e rico emirado vizinho aos sauditas, mas dono de uma política externa autônoma, a desenvolver laços com o Irã.
A Arábia Saudita, apoiada pelo Egito, anunciou em junho rompimento de relações diplomáticas com o Qatar, tentativa de forçar o vizinho a rever vínculos com o governo iraniano. Os sauditas deslancharam a ofensiva após receberem a visita do presidente norte-americano, Donald Trump, entusiasta da aproximação entre potências sunitas e Israel, a fim de isolar o Irã.
O flerte entre Israel e monarquias do golfo Pérsico, no entanto, antecede à era trumpiana. A imprensa israelense recentemente noticiou que, em 2012, Netanyahu se reuniu às escondidas, num hotel de Nova York, com o ministro das relações exteriores dos Emirados Árabes Unidos, aliado saudita.
Agora, de volta à crise recente. Na quinta (27), a Arábia Saudita reivindicou a paternidade de "conversas com líderes internacionais" responsáveis, segundo a nota oficial, por desarmar a crise em Jerusalém.
A temperatura baixou quando o governo Netanyahu decidiu retirar dispositivos de segurança instalados em entradas da Esplanada das Mesquitas logo após o atentado que matou dois policiais israelenses.
Embora o comunicado saudita não revele os interlocutores, restam poucas dúvidas sobre contatos, diretos ou indiretos, com autoridades israelenses. Também houve, nas articulações, participação de norte-americanos, egípcios e jordanianos.
Na diplomacia do Oriente Médio, a Arábia Saudita e Israel tendem a coordenar novas ações, ainda que sem manter laços oficiais, preocupados em conter a influência iraniana na região.
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