renata lo prete
escreveu até março de 2001
Renata Lo Prete, jornalista, entrou na Folha em 1986, no caderno "Ilustrada". Foi editora-adjunta de "Mundo", editora de "Ciências" e, em 1998, assumiu o cargo de ombudsman, que ocupou por três anos. Foi ainda editoria da coluna Painel, publicada diariamente no caderno "Poder".
Uma gafe após outra
Há três meses, escrevi que a "Gafe da Semana", seção em que o TV Folha ri dos tropeços dos outros, acaba causando mais constrangimento ao jornal do que aos insultados.
De lá para cá, a coisa só piorou. Além de destacar erros menos graves do que os cometidos pelo jornal todos os dias, a seção tem perpetrado, ela mesma, uma gafe após outra.
Na edição de 5 de dezembro, o alvo de chacota foi Amaury Jr., que durante uma entrevista "olhou para seu relógio de pulso e anunciou que a temperatura ambiente era de 33 graus".
Na ocasião, um leitor perguntou se alguém tivera o cuidado de conferir que relógio Amaury Jr. usava. Lembrou que há anos existem modelos com dispositivo para medir temperatura.
Depois de 20 dias e muita insistência, veio a resposta. "Por causa do leitor", dizia a mensagem, a Redação teve de "pagar o mico" de ligar para a assessoria do apresentador. Esta teria informado que o relógio dele não tem termômetro.
Tendo ou não, a gafe impressiona menos do que o reconhecimento de que não houve verificação prévia. O jornal tem a desfaçatez de culpar o leitor por tê-lo forçado a trabalhar direito, ainda que com atraso. Algo pior ocorreu na edição seguinte. O TV Folha acusou um repórter da CBS Telenotícias de confundir o cantor Beck com o guitarrista Jeff Beck.
Forneceu nome completo do jornalista, que no dia seguinte me escreveu para informar que nem ao menos estava trabalhando quando o referido equívoco foi levado ao ar.
O "erramos" omitiu que a trapalhada aconteceu na "Gafe da Semana", ou seja, que o jornal fez uma acusação infundada no espaço em que aponta as deficiências alheias.
Para fechar o ano, a eleita de domingo passado foi Ivete Sangalo, tripudiada por supostamente ignorar que a cidade de Ilhéus fica na Bahia.
A cena: alguém perguntou à cantora se este seria seu primeiro réveillon fora da Bahia (ela tinha participação marcada na festa da avenida Paulista); "já passei um em Ilhéus", respondeu.
Quando li a nota, percebi que seu redator, aparentemente, não sabe que os baianos chamam de Bahia não apenas seu Estado natal, mas também a capital, Salvador.
É um hábito de que o "estrangeiro" se dá conta em conversas e nos livros de Jorge Amado, para citar somente o autor mais famoso. Não é crime desconhecer essa maneira de falar, mas a gafe, se existiu, não foi de Ivete Sangalo.
A mesma observação foi feita por dois leitores, um de Feira de Santana (BA) e outro de São Paulo. Resposta a eles: "Não dá para dizer que é correto chamar Salvador de Bahia". Por que não dá, se esse é o costume local? Se aprendi algo em quase dois anos nesta função é que a Redação não tem medo de passar ridículo quando se trata de negar as evidências de seus enganos.
A "Gafe da Semana" não é item de destaque na edição de domingo. Seu problema é de atitude. Uma seção fixa para zombar dos erros dos outros me parece incompatível com o elevado grau de imperfeição de um jornal diário.
A Folha tem o direito de pensar de outra forma. Mas não é demais pedir critério na seleção e checagem das histórias. Da maneira como a seção vem sendo feita, o objeto de riso é o jornal.
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