Vacinação de idosos contra a febre amarela tem controle precário em SP

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CLÁUDIA COLLUCCI
PAULO GOMES
DE SÃO PAULO

Idosos de São Paulo estão sendo vacinados contra a febre amarela sem avaliação médica sobre o estado de saúde e os riscos e benefícios da imunização, apesar de recomendação de entidades médicas. Quando vacinadas pela primeira vez, pessoas acima de 60 anos correm mais risco de desenvolver uma doença semelhante à febre amarela, a chamada febre vacinal.

"Acima dos 60 anos, o idoso perde de 2% a 3% de imunidade a cada ano. É arriscado ele receber a vacina sem antes passar por avaliação médica", diz o infectologista Caio Rosenthal, do Hospital do Servidor Estadual, que avaliou 37 idosos na última quinta (11).

De acordo com a geriatra Maisa Kaialla, presidente da comissão de vacinas da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, pessoas com 60 anos ou mais devem passar por uma avaliação criteriosa do médico. Para ela, todos os postos de vacinação deveriam ter um médico analisando os riscos e os benefícios de o idoso ser vacinado.

Febre Amarela

Segundo Maisa, é fundamental essa avaliação, que envolve exame físico e perguntas como quais remédios a pessoa toma, como está imunidade e a qualidade de vida.

"É importante ter certeza de que não há nenhuma restrição de saúde, uma doença crônica ou o uso de imunossupressores, que valha o 'risco' de se vacinar. Quanto mais fragilizado este estiver, maior o risco de complicação em razão da vacina", explica.

Por isso, ela reforça a recomendação de que só idosos que vivem ou viajarão para uma área de risco devam ser vacinados –após avaliação.

Já o coordenador do controle de doenças do Estado, Marcos Boulos, diz que o controle pode ser feito pela própria equipe de vacinação nos postos de saúde. "Ele vai determinar [a vacinação] por idade avançada, e, se tiver dúvida, vai pedir que o idoso dê um atestado, informe se tem doença prévia. Se achar que há risco, não vai vacinar."

A prática, no entanto, é menos criteriosa. A Folha visitou postos de saúde na região mais afetada pelo atual surto da doença na capital, a zona norte, e verificou que o controle de vacinação para idosos tem sido elementar.

"Você não está fazendo nenhum tratamento à base de corticoide [remédio que, como efeito colateral, reduz a imunidade], não, né?", pergunta a agente de saúde para a aposentada Maria do Carmo da Silva, 82, na UBS Vila Barbosa, no Limão.

À reportagem agentes de saúde disseram que se limitam a questionar apenas se a pessoa tem idade avançada, se tem alergia a ovos (a vacina é composta por uma dose atenuada do vírus em clara de ovo) ou se a saúde está muito debilitada. Após receber a vacina, andando com dificuldade, Maria do Carmo diz que "a saúde está ótima".

Crédito: Editoria de Arte/Folhapress

A um 1 km dali, na UBS Dr. Walter Elias, na Casa Verde, Claudio Corrietti, 74, diz ter seguido a recomendação de exame prévio. "Passei pela médica, e os exames estão todos corretos." Ele então se dirige à coordenadora do programa de imunização do município, Maria Lígia Nerger, presente na UBS no momento. "Não vai dar reação?"

Segundo ela, aproximadamente 4% das pessoas vacinadas podem ter febre, dores no corpo e dor de cabeça. "Se persistir, o senhor vai no médico para ver qual o motivo", recomendou ela ao aposentado.

A febre amarela decorrente da vacina, no entanto, é uma complicação muito rara: 1 para cada 250 mil doses aplicadas. Doenças neurológicas, como encefalite e meningite, são outro efeito colateral, com frequência estimada de um caso para cem mil doses.

Se o risco de infecção da febre amarela for maior que o risco de apresentar evento adverso grave, a vacina deve ser recomendada, desde que não exista contraindicação, diz o infectologista Caio Rosenthal. Em dois casos de idosos examinados, Rosenthal não recomendou a vacina porque eles estavam recebendo medicação imunossupressora.

Moradora da Casa Verde, Darci Barbieri, 76, foi tomar a vacina com as filhas, Sônia, 57, e Silene, 54. "Só me perguntaram a idade e se a saúde está boa." As filhas só foram indagadas da idade.

A presidente da Sociedade Brasileira de Imunologia, Isabella Ballalai, diz que há um erro de interpretação na recomendação de avaliação médica. "Muitas vezes ela é entendida como um exame laboratorial. Na realidade o que é necessário é uma avaliação do risco-benefício."

Ela explica que uma pessoa com mais de 60 anos que não vive em área de risco não tem motivo para assumir a chance dos efeitos adversos. Mas, se mora em área de risco, o risco é maior e a vacina deve ser aplicada. Isabella Ballalai minimiza a questão de a avaliação ser feita na triagem ou por um médico. "Diante de um surto, dificultar qualquer coisa colocaria em risco a campanha."

OUTRO LADO

Em nota, a Secretaria Municipal da Saúde afirma que "todas as pessoas passam por uma triagem antes de tomarem a vacina contra a febre amarela", para verificar se há alguma contraindicação à vacina.

Em caso de dúvida, o paciente é aconselhado a procurar médico que o acompanhe regularmente.

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