Pecuária, salvação da lavoura?
Participantes do encontro argumentam que a criação de gado é o setor do agronegócio com mais oportunidades para reduzir as emissões de carbono
Expandindo-se por mais de 170 milhões de hectares, a pecuária é a atividade econômica que mais ocupa solos no Brasil e é tida como um dos principais vetores do desmatamento da Amazônia.
Ao mesmo tempo, é o setor do agronegócio onde há mais oportunidades para aumento de produtividade e redução das emissões de carbono, segundo especialistas que participaram do Fórum Desmatamento Zero.
Um dos principais desafios é intensificar a produção e sair da ocupação média de um boi por hectare para três ou quatro cabeças/hectare.
Além disso, as pastagens que hoje estão degradadas podem voltar a abrigar áreas de expansão da agricultura, sem a necessidade de avançar sobre regiões onde a floresta ainda está intacta.
"A pecuária foi uma estratégia barata de ocupação do solo na região Norte, estimulada durante o regime militar. Com aumento da produtividade, será possível direcionar 40 milhões de hectares de pastos degradados para o plantio de grãos", disse Márcio Nappo, diretor de sustentabilidade da JBS Brasil.
A empresa, maior produtora de proteína animal do mundo, investe desde 2009 em monitoramento via satélite para não comprar gado de fazendas que desmatam ilegalmente na Amazônia.
O frigorífico viu seu nome exposto no relatório "Comendo a Amazônia", do Greenpeace, que mapeou a nada sutil relação entre a pecuária e a devastação do bioma. Pressionadas pelo Ministério Público, empresas do setor reorganizam sua cadeia para rastrear a origem da carne e o impacto sobre a floresta.
Só a JBS monitora 70 mil fazendas que fornecem gado (são 40 mil na Amazônia) e utiliza dados dos satélites do Inpe para conferir se as áreas de criação do gado coincidem com os locais onde há desmatamento. Quando isso ocorre, os fornecedores são bloqueados.
A partir de maio de 2016, a empresa passará a utilizar o CAR (Cadastro Ambiental Rural) como pré-requisito para a compra da carne.
Para o ambientalista Nilo D'Ávila, do Greenpeace, que participou da elaboração do relatório que denunciou a pressão da pecuária sobre a floresta, o setor deu passos importantes nos últimos cinco anos. "É indiscutível a evolução da pecuária. Hoje, os três maiores frigoríficos monitoram suas cadeias", disse.
O uso de incentivos econômicos para estimular uma pecuária mais verde é bandeira do economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal. Em 2012, ele se debruçou sobre as leis tributárias na tentativa de encontrar caminhos para a taxação de atividades poluentes.
Appy apresentou a ideia da Cide-Carbono, uma nova versão da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), que incidiria sobre energia fóssil e pecuária, taxando as emissões por cabeça de gado no frigorífico, de acordo com a idade do animal. A proposta foi apresentada ao governo, mas não chegou a ser aplicada.
"Há uma relação entre produtividade, idade de abate dos animais e emissão de carbono. Faria sentido direcionar tributos para fomentar uma pecuária mais produtiva", disse Appy. Com a economia em recessão, porém, o tema parece ter sumido do radar do governo federal.