Sem conseguir repatriar receitas, Gol quer cortar rota venezuelana
Aérea já reduziu voos semanais de 28 para 16; câmbio e querosene em dólar estrangulam contas
Dinheiro do setor aéreo naquele país chega a US$ 3,8 bi; TAM não comenta, mas já não oferece rota no site
Impedida de repatriar o equivalente a R$ 351 milhões retidos na Venezuela devido a distorções de câmbio, a Gol está reavaliando a rota entre São Paulo e Caracas, que opera desde 2007.
A empresa, fortemente atingida pela alta do dólar, já reduziu a frequência de 28 para 16 voos semanais desde o ano passado e estuda aprofundar os cortes. "Neste contexto de crise e alta do dólar, não há como negar que, se não encontrarmos uma solução [ao impasse na Venezuela], teremos de pensar se o voo será mantido", diz Alberto Fajerman, diretor de Relações Institucionais da Gol.
Não era possível, até a conclusão desta edição, comprar passagens para Caracas.
A TAM, que opera a mesma rota uma vez por semana e tem R$ 161 milhões bloqueados no país, se recusou a tratar do tema com a reportagem. O site da empresa, porém, já não oferece a opção de voo direto para Caracas.
O problema, comum a todas as companhias aéreas estrangeiras na Venezuela, decorre do complexo sistema de câmbio do país, que é controlado com mão de ferro pelo governo socialista e funciona com base em diferentes taxas de conversão.
A lei venezuelana obriga as empresas a vender em bolívar, moeda local. Parte do dinheiro arrecadado é usada para gastos na Venezuela, como salário de funcionários locais, pagamentos de taxas e de querosene.
O excedente, porém, precisa ser transformado em dólar para ser repatriado até a sede das companhias aéreas.
Em 2012, as empresas podiam repatriar o dinheiro a uma taxa preferencial de 4,3 bolívares por US$ 1. Em 2013, o índice de conversão passou para 6,3 bolívares/US$ 1. O cenário tornou-se mais adverso neste ano, quando o governo impôs uma conversão a 12 bolívares/dólar, o que significou, na prática, uma desvalorização abrupta dos ativos das empresas aéreas no país.
A Associação Internacional do Transporte Aéreo (Iata) vem cobrando do governo venezuelano que permita às empresas repatriarem fundos na taxa mais favorável. A dívida total das companhias atinge US$ 3,8 bilhões.
A dificuldade de repatriar fundos, conjugada à queda da ocupação dos voos gerada pela crise econômica, já levou Air Canada e Alitalia a interromper voos para Caracas. O tráfego de passageiros no país caiu 8,5% no ano passado, contrariando tendência de alta na América Latina, segundo a Iata.
QUEROSENE EM DÓLAR
A situação complicou-se ainda mais com a decisão da Venezuela, adotada em setembro, de cobrar das estrangeiras querosene em dólar. "Temos um monte de dinheiro lá, que não podemos receber, só falta agora ter que mandar mais dinheiro para pagar o combustível extraído e refinado na própria Venezuela", questiona Fajerman.
Caso a linha se encerre, a Gol cogita comprar imóveis para preservar seu capital no país até poder repatriá-lo.