Eu voltei
Com discurso mais duro contra imigrantes, ex-presidente francês Nicolas Sarkozy disputa comando de seu partido de olho na eleição presidencial de 2017
Com coro de 3.000 militantes gritando seu nome e na mira de centenas de câmeras de smartphones, o ex-presidente da França Nicolas Sarkozy (2007-2012) entra rapidamente no ginásio no subúrbio rico de Boulogne-Billancourt, a oeste de Paris, na última terça-feira (25).
Ali, ele se reuniria com militantes de sua UMP (União para um Movimento Popular), de centro-direita. Sarkozy é o favorito na eleição interna do partido deste sábado (29). O comando da máquina é parte do percurso para disputar, em 2017, a sucessão do impopular presidente socialista François Hollande.
Como num passe de mágica, o som dos alto-falantes do ginásio, que soava abafado durante discurso do orador que o antecedeu, tornou-se límpido assim que o ex-presidente começou a falar.
"Foi aqui em Boulogne que eu participei da primeira reunião política da minha vida e o meu coração sentiu que ia fazer política até morrer", afirmou Sarkozy.
"Eu tinha 19 anos, era possível sonhar em ser o presidente da República Francesa", completou, arrancando aplausos pelo público.
Desde que anunciou o retorno à cena política em setembro, Sarkozy já participou de 20 comícios na disputa da UMP. Voltar ao Palácio do Eliseu é objetivo ainda não declarado, mas ele opera e discursa como candidato a presidente, com críticas a socialistas e extrema direita.
Sarkozy refaz um percurso de dez anos atrás, quando disputou e venceu a eleição para a presidência da UMP e, em 2007, foi eleito presidente da República.
Em sua versão atual, Sarkozy se esforça para parecer cada vez mais linha-dura contra a imigração. A intenção é atrair o eleitorado que simpatiza com Marine Le Pen, líder da Frente Nacional, de extrema direita, que ganha terreno a cada eleição na França.
Em Boulogne-Billancourt, Sarkozy foi ovacionado quando defendeu que a França abandonasse o tratado de Schengen --que define a política europeia de livre circulação de pessoas-- para proteger o estilo de vida do país.
"Não acredito mais que é possível reformar o sistema. É necessário sair de Schengen antes de estabelecer um novo acordo", discursou.
Uma característica que permaneceu intacta ao longo dos anos foi a capacidade de produzir perplexidade e manchetes com bravatas. No comício, afirmou que, quando presidente, achou que "fazia sentido" nomear uma filha de pai argelino e mãe marroquina para cuidar da área penal como ministra da Justiça.
A declaração provocou intenso debate: a ligação entre imigrantes e criminalidade fora apenas mais uma gafe ou xenofobia de caso pensado?
ADVERSÁRIOS INTERNOS
A volta de Sarkozy tem sido mais acidentada do que o previsto: em outubro, sua popularidade entre militantes da UMP caiu de 85% para 71%, segundo o instituto BVA.
Ainda que tenha uma vitória esmagadora na disputa partidária, o próprio Sarkozy evita dizer se conseguirá alcançar os mesmos 85% dos votos que teve na eleição interna de 2004.
Segundo analistas, um dos obstáculos para a nova candidatura presidencial é a coleção de processos e investigações judiciais que ele enfrenta. São ao menos seis em curso, que vão de suspeita de tráfico de influência a suposto caixa dois de campanha.
Ao mencionar as encrencas judiciais, Sarkozy é econômico nas palavras e culpa o governo Hollande: "Os socialistas atropelaram a presunção de inocência para fazer populismo".
Outro front é interno. O prefeito de Bordeaux, Alain Juppé, primeiro-ministro na presidência de Jacques Chirac, não disputa o comando do partido, mas é visto como principal rival interno de Sarkozy na disputa pelo posto de candidato da UMP em 2017.
No último sábado em encontro com a militância justamente em Bordeaux, apoiadores de Sarkozy vaiaram estrepitosamente Juppé. O episódio foi classificado pelos jornais franceses como o início da guerra aberta da UMP pela indicação presidencial.
O SORRISO DE CARLA
Nos encontros da UMP, Sarkozy só responde a militantes pré-cadastrados, sem falar com jornalistas.
A ex-modelo e cantora Carla Bruni acompanha o marido com discrição. Ao deixar o ginásio por um corredor de isolamento, Bruni voltou-se para o repórter da Folha ao ser perguntada se ela estaria de volta ao Eliseu em 2017.
A ex-primeira-dama apenas abriu um sorriso e seguiu para o carro. Como Sarkozy, Carla também não responde a perguntas que estejam fora do script da campanha.