Petrolão
Defesa de ex-diretor ataca prova usada para a prisão
Advogado de Renato Duque, preso, questiona papel que veio de Mônaco
Papéis seriam ilícitos porque não passaram por órgão de Brasília; procurador afirma que isso não era necessário
A defesa do ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque questiona a validade de documentos vindos do Principado de Mônaco que foram usados pela força-tarefa da Operação Lava Jato para justificar a prisão dele.
Duque foi preso em 16 de março, sob acusação de ter transferido para Mônaco € 20 milhões (cerca de R$ 67 milhões) que estavam depositados na Suíça. Os recursos seriam oriundos de propina, segundo procuradores e delatores da Lava Jato.
Documentos sobre essa movimentação financeira enviados de Mônaco por e-mail aos procuradores da Lava Jato ajudaram a embasar o pedido de prisão, aceito pelo juiz federal Sergio Moro.
Os advogados de Duque sustentam que houve ilegalidade porque os papéis de Mônaco não passaram pelo órgão federal brasileiro responsável pelos atos de cooperação jurídica internacional, o DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional), ligado ao Ministério da Justiça.
O principal tratado internacional sobre cooperação jurídica, a Convenção de Mérida, descreve que documentos devem tramitar por meio das autoridades indicadas pelo governo de cada país. No Brasil esse papel cabe ao DRCI.
"A impressão que temos é que o Ministério Público Federal, violando as regras processuais, obteve sem as devidas autorizações elementos que pretende usar como prova. Como não houve autorização, essa prova é ilícita", diz o advogado Alexandre Lopes.
Para o defensor, "é mais uma nulidade num processo tomado por ilegalidades".
Lopes pretende levar essa questão para o STF (Supremo Tribunal Federal).
Segundo a Procuradoria, os documentos que comprovam transferências de Duque para contas em Mônaco mesmo após a deflagração Lava Jato foram encaminhados por autoridades de Mônaco por e-mail, em caráter de urgência. Depois, esses e outros papéis de Mônaco chegaram por correio à Procuradoria, que os enviou ao DRCI.
A movimentação financeira foi um dos principais motivos para pedir a prisão de Duque, segundo a força-tarefa.
INTERPRETAÇÕES
Ao notar que os primeiros documentos chegaram ao Brasil sem passar pelo DRCI, o advogado de Duque notificou o juiz Moro desse fato e pediu acesso à documentação completa. Moro determinou então que a Procuradoria se manifestasse a respeito.
Em petição, o procurador da República Deltan Dallagnol afirmou que o envio dos papéis para a força-tarefa, sem passar pelo DRCI, não configura irregularidade.
Dallagnol argumentou que esse tipo de comunicação direta é possível quando agiliza a cooperação ou quando há urgência, o que teria acontecido no caso de Duque.
Indagado pela Folha sobre a regra da Convenção de Mérida, que aponta o trâmite pelo DRCI, o procurador disse que essa disposição serve como orientação, mas não proíbe a adoção de outros caminhos para obtenção de prova.
Dallagnol afirmou ainda que a defesa de Duque pode verificar a autenticidade dos documentos, pois eles se referem a contas bancárias que eram mantidas pelo ex-diretor da Petrobras.
Não há consenso entre estudiosos sobre essa questão. A Folha ouviu três pesquisadores a respeito da situação. Eles pediram para não ter o nome identificado. Um deles apontou que o envio de provas diretamente aos procuradores deveria gerar a nulidade na prisão.