Latorraca volta à cena após crise de saúde, dirigido por Gerald Thomas
"Entredentes" começou dois anos atrás, quando o ator Ney Latorraca, 69, arrancou risadas do diretor Gerald Thomas, 59, em sua casa, no Rio, ao fazer uma imitação.
A partir da imagem de um garoto que ameaça matar a mãe se não ganhar um tênis, "o Gerald começou a escrever". Chegaram a ensaiar em Londres, onde vive o diretor.
Mas a peça que estreia no próximo dia 10, em São Paulo, não tem mais nada disso. "Entredentes" retrata vagamente o encontro de um judeu ortodoxo, Latorraca, com um islâmico radical, interpretado por Edi Botelho, 57.
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No meio do caminho, relata Thomas, "Ney teve o piripaque". "E a coisa ficou preta", acrescenta Botelho. Latorraca se internou no Rio para o que seria uma cirurgia simples: "Eu fui operar a vesícula. E foi uma loucura".
Botelho, que permaneceu ao lado do companheiro inconsciente, relata: "Era entupimento dos canais biliares, que virou infecção. Ney quase morreu. Fizeram cirurgia de emergência, colocaram dreno. Finalmente, puseram 'stent' e a bílis passou a correr. Só aí ele se recuperou."
Lenise Pinheiro - 20.mar.2014/Folhapress | ||
Latorraca no intervalo de ensaio em SP |
"PSYCHIC"
O diretor afirma que também viveu tudo aquilo, ele próprio, por uma semana. Latorraca comenta: "Foi uma coisa muito engraçada. Ele ficou mal lá em Londres".
Thomas diz que "não conseguia respirar" e passou a ouvir vozes. "Um dia enchi vasilhas de água e sal e joguei pela casa. Aí veio mensagem do Rio dizendo que Ney estava desidratado, precisava de potássio. Mas voltou ao normal, porque eu contrabalancei com o sódio do sal."
Diz que chegou a visitar um centro "psychic" em Londres, assustado, porque queria "fazer teatro, não receber santo". Instruído pelo telefone por uma médium carioca, acendeu vela e até tomou "banho de rosa branca".
Antes, porém, teria ouvido de uma das vozes um nome, que mencionou para os atores. Assombrados, Botelho e Latorraca dizem ter confirmado depois que foi o nome de um médico que não estava escalado, mas participou da última e bem-sucedida cirurgia.
"Foi coisa tão intensa", segundo Botelho, que o episódio foi parar em várias passagens da peça —que aliás, diz Latorraca, "tem de tudo".
Lenise Pinheiro - 20.mar.2014/Folhapress | ||
Thomas em entrevista sobre 'Entredentes' |
DO MURO À VAGINA
O espetáculo começa com o próprio Latorraca entrando no palco pelo fundo, vestido de astronauta, através do cenário: uma gigantesca vagina, que no ensaio acompanhado pela Folha ainda não passava de maquete virtual.
Com o correr da peça, a vagina se transforma em fresta do Muro de Berlim e, por fim, no Muro das Lamentações. Thomas explica, dentro do possível: "A ideia é que dois extremistas opostos se encontram no Muro das Lamentações, só que de muro em muro você vai pensando...".
Enquanto o autor-diretor descreve referências como a atual crise na Crimeia ou a Primeira Guerra Mundial, Latorraca comenta: "É uma viagem, né?!". É também uma comédia, pelo que se viu na sala de ensaios no bairro da Barra Funda, em São Paulo.
E uma comédia pontuada pelas intervenções em que Ney, nome também do personagem, recebe um "preto véio". Logo no início, depois de ouvir sua própria voz gravada, sai falando alto, assustado: "Esse não fui eu! Tem alguma coisa grave acontecendo! Tem alguém usando a minha voz! Isso é coisa de preto velho. Prepara a mesa, Didi, porque hoje vai baixar".
Além de Ney e Didi, este o nome do personagem de Botelho, também entra em cena de tempos em tempos Maria, que é representada pela atriz portuguesa Maria de Lima, 48. É ela a responsável por dar voz, em "Entredentes", às críticas mais diretas do autor-diretor aos "recalques" que identifica nos brasileiros.
São provocações que mudam a toda hora. Para Latorraca, "o mais interessante" na peça são essas intervenções "jornalísticas, que mantém o espetáculo com vida".
ENTREDENTES
QUANDO Estreia dia 10 de abril
ONDE Sesc Consolação, r. Dr. Vila Nova, 245, tel. (11) 3234-3000
QUANTO de R$ 7 a R$ 35, à venda nas unidades do Sesc
Livraria da Folha
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