Semana final joga no lixo os bons momentos de 'Império'
Aguinaldo Silva escalou o panteão dos autores globais do primeiro time graças a um universo que flertava com o realismo mágico latino-americano.
Depois do sucesso retumbante de "Roque Santeiro" em 1985, em coautoria com o veterano Dias Gomes, enfileirou novelas com universos fantásticos, longe do realismo. Com essa fórmula, colheu seus maiores sucessos.
O problema é que, no século 21, o autor resolveu ambientar suas tramas no Rio de Janeiro, supostamente no terreno do realismo. Depois de uma primeira bem-sucedida incursão no novo gênero, a redonda "Senhora do Destino" (2004), vieram as criticadas "Duas Caras" (2007) e "Fina Estampa" (2011).
"Império" foi vendida como uma trama épica, que resgataria o horário do fiasco constrangedor da última trama de Manoel Carlos, "Em Família" (2014), e mostraria Silva como autor contemporâneo, livre dos microcosmos de Asa Branca, Tubiacanga e afins.
Alex Carvalho/TV Globo/Divulgação | ||
'Comendador' José Alfredo (Alexandre Nero, centro), cercado na sala de reuniões da Império |
Com uma estreia ágil, baseada na certeira escalação do elenco, um texto afiado e uma fotografia e montagem que em tudo remetiam a "Avenida Brasil" (2012), a novela que todo autor da Globo passou a querer emular, parecia que daria jogo.
Mas os meses foram se passando e Aguinaldo foi se perdendo nas brumas do surrealismo e nas incoerências de uma trama mal amarrada.
O sucesso das séries norte-americanas, que vivem sua era de ouro desde "The Sopranos", se deve a uma fórmula que mistura personagens complexos, multidimensionais, e um sistema de escrita que, apesar da presença do "headwriter", divide a tarefa de escrever os episódios entre os roteiristas. A existência, na Globo, da figura do autor-diva faz com que o telespectador tenha de engolir goela abaixo arbitrariedades que jogam a credibilidade da história pelo ralo.
Foi assim com a esdrúxula troca de Drica Moraes por Marjorie Estiano como a Cora madura, já da metade para o fim do folhetim. Glória Perez, outra mestre desse tipo de bizarrice, disse, quando questionada pelas incongruências de "Salve Jorge" (2012), que era preciso que o público soubesse voar.
Mas o que novelistas como ela e Aguinaldo pedem é que o telespectador se jogue do precipício sem asa-delta.
Na última semana, "Império" colecionou cenas embaraçosas, desde um assassinato à luz do dia numa rua de Santa Teresa tão movimentada quanto uma feira livre, até a última, que mostrou o "comendador" José Alfredo (Alexandre Nero), já morto, observando da janela do casarão.
Quer matar o protagonista? Excelente, ousado do ponto de vista da dramaturgia. Mas assuma a opção. Trate de fazê-la coerente.
Aguinaldo Silva preferiu perder tempo dando spoilers do final da novela no Twitter e fazendo uma participação especial ególatra no epílogo a cuidar do texto e da harmonia do final de sua história.
Só conseguiu jogar no lixo os bons momentos de "Império", conseguidos à custa da boa atuação de atores que foram forçados a declamar um texto primário na reta final da novela. Pobre Othon Bastos.
IMPÉRIO
AVALIAÇÃO ruim
Livraria da Folha
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade
- 'Fluxos em Cadeia' analisa funcionamento e cotidiano do sistema penitenciário
- Livro analisa comunicações políticas entre Portugal, Brasil e Angola
- Livro traz mais de cem receitas de saladas que promovem saciedade