CRÍTICA
Estreia de David Jung não anuncia nenhum talento especial
O cinema de terror já foi metafísico, barroco, alegórico, erótico, engajado, fez crítica social e desafiou nossos limites de suportar a violência e o medo. A avalanche recente de produções do gênero parece apenas fascinada pelos dispositivos digitais e se esquece do poder assombroso da imaginação.
Em "A Possessão do Mal", por exemplo, estamos diante da enésima variação do "found footage", o filme que simula ser o registro feito por alguém que foi meter o nariz onde não devia e se deu mal.
O coitado da vez é um tal Michael King, um jovem documentarista que registra sua felicidade familiar num plácido domingo no parque para ter a certeza de que sempre poderá revivê-la. No instante seguinte, a morte súbita de sua mulher espatifa seus sonhos.
A partir daí, ele decide realizar um documentário em primeiro pessoa, um equivalente a "Super Size Me "" A Dieta do Palhaço" (2004), para demonstrar que o espiritualismo e as crenças religiosas não passam de embromações para distrair as almas dos ingênuos.
Divulgação | ||
O ator Cullen Douglas em cena do longa "A Possessão do Mal" |
Na primeira parte do filme, o realizador assume uma postura cética e cínica durante entrevistas com uma vidente, um padre exorcista internado num asilo e um casal que se dedica ao ocultismo demonológico.
Ao se submeter a um estranho teste de São Tomé, Michael passa a ouvir vozes, mergulha numa insônia permanente e seu transtorno obsessivo-compulsivo só piora.
As câmeras e gravadores de que ele se cerca com a confiança de que servem para registrar a realidade passam a ser controlados pelas tais forças do mal, comandam atos que escapam à vontade dele e exigem o sacrifício de Ellie, a pequena filha que Michael venera.
Nessa segunda parte, o filme se torna uma sucessão mecânica de torturas físicas, mutilações e sanguinolências na qual falta a substância própria do gênero terror: medo.
Numa cena de deformação física de Michael, os efeitos visuais são tão toscos que nossa primeira reação é a de quem assiste a um terror.
Mas o filme se leva bem a sério, estica e puxa seus 83 minutos até que Michael, numa variação da duplicidade de "O Médico e o Monstro", encontre Ellie escondida e possa decidir se ainda é o pai bonzinho ou a marionete movida por forças malignas.
O roteiro e direção assinados pelo estreante David Jung não anunciam nenhum talento especial, apenas nos deixam prevenidos para evitar um reencontro com seu nome em breve. (CÁSSIO STARLING CARLOS)
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