Rabugento, Jerry Lewis encantou brasileiros e irritou comunidade gay

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GUILHERME GENESTRETI
DE SÃO PAULO

Morto neste domingo (20), o comediante Jerry Lewis colecionou polêmicas, principalmente relacionadas a comentários ofensivos feitos à população LGBT, e uma fama de rabugento incorrigível.

Convidado em 2013 para atuar numa ponta no filme brasileiro "Até que a Sorte nos Separe 2", o ator deixou apreensiva a equipe do longa. Na trama, Lewis interpreta o carregador de malas do hotel em Las Vegas em que se hospeda o milionário interpretado por Leandro Hassum.

"Ele chegou com mil restrições: não podia ficar muito tempo de pé, tinha um problema na coluna, não queria vestir o smoking...", lembra o diretor do filme, Roberto Santucci. Mas aos poucos, diz ele, seu lado cômico "começou a tomar conta do set".

As dores nas costas eram reflexo de um acidente que o comediante sofreu em 1965, durante um show num hotel, americano, e que o levariam a ficar viciado num analgésico pelos próximos 13 anos.

"Dava para ver que ele se transformava quando fazia aquilo que mais gostava, que era o humor. Quando ele entrava no barato dele, a idade desaparecia", diz Santucci.

Não que as coisas tenham corrido com total serenidade. "Muitas vezes eu tinha que tentar convencê-lo de fazer algumas coisas, mas foi uma experiência bacana", afirma.

Adeus a Jerry Lewis
Comediante morreu aos 91 anos

A ideia de trazer Lewis ao filme –e de nele reprisar seu papel em "O Mensageiro Trapalhão" (1960) teve dedo do comediante Marcius Melhem, parceiro de Hassum e colunista da Folha.

"Todo comediante da minha geração foi influenciado pelo humor dele", diz Melhem. "Eu, que por muito tempo fiz humor físico, era fissurado no trabalho dele. O que ele fazia com Dean Martin influenciou muito o que eu e Leandro Hassum fazemos."

Os dois atores brasileiros contracenaram com Jerry Lewis em "Até que a Sorte nos Separe 2". "Só de estar ao lado dele no set depois de tudo ao que assisti dele foi inesquecível", afirma Melhem.

Um dos produtores do longa, Fabiano Gullane lembra do primeiro contato que teve com o americano, para fazer o convite da participação.

"Ele chegou com uma pastinha tipo 007 para fazer a reunião. De repente, abriu a mala e sacou um nariz de palhaço e baralho de mágico", afirma o produtor. "Em sua última cena, foi ovacionado."

POLÊMICAS

Ovações à parte, Jerry Lewis protagonizou polêmicas com a comunidade gay, que o levaram a se desculpar.

Durante uma maratona beneficente realizada em 2007, o ator fez piada com um parente imaginário seu, que ele chamou de "Jesse, The Illiterate Faggot" (algo como "Jesse, o viado analfabeto"). Lewis teve que se desculpar publicamente pelo comentário.

No ano seguinte, falando à televisão australiana, o ator disse que achava o críquete, paixão nacional naquele país, um "esporte de maricas". O comentário foi acompanhado de Lewis gesticulando de maneira bastante afeminada.

As mulheres foram outras vítimas: em 2000, num evento de humor, disse não gostar de comediantes do sexo feminino. "Penso nelas como máquinas de produzir bebês".

Ironicamente, o ator propalava a história de ter sido expulso do colégio onde cursava o ensino médio após ter dado um soco no diretor da escola, que o insultou com um comentário antissemita.

O ator também dizia ser confidente do amigo Sammy Davis Jr., que lhe telefonava chorando para falar das ofensas racistas de que era vítima.

Em 2015, Lewis criticou o então presidente Barack Obama ("nunca foi um líder"), disse que refugiados deveriam ficar "na puta que o pariu onde estão" e elogiou a candidatura de Donald Trump: "Ele é ótimo porque é um 'showman'. E nunca tivemos um na cadeira presidencial."

Embora fosse afiliado ao Partido Republicano, dizia ter sido amigo do ex-presidente democrata John F. Kennedy.

'A PIOR ENTREVISTA'

Lewis também era famoso pelo mau humor com que tratava jornalistas e o público de seus shows em Las Vegas.

No ano passado, para um especial feito pela revista "The Hollywood Reporter" com artistas nonagenários, foi rude com seu entrevistador, despejando respostas monossilábicas e o deixando nitidamente constrangido. Ele ainda imitou a risada do jornalista com certo desdém.

Questionado sobre já ter cogitado aposentadoria, o ator de 91 anos respondeu com dois irritados "porquês" ("Por quê? Por quê?"). Quando indagado sobre as razões de gente da sua geração continuar na labuta, dispara: "Porque somos bons nisso".

A reportagem em vídeo viralizou e ganhou o apelido de "a mais constrangedora entrevista de 2016".

Não era um artista modesto. O site IMDb, vasta base virtual de dados sobre cinema e televisão, compila um de seus famosos arroubos.

"Sou um gênio multifacetado, rico, talentoso e famoso internacionalmente [...] Minha resposta a meus críticos é simples: Eu gosto de mim. Gosto do que me tornei e tenho orgulho do que conquistei. E eu acredito que nem arranhei a superfície ainda."

Veja a seguir a "pior entrevista de 2016", segundo a "Hollywood Reporter":

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