Nação Zumbi faz álbum de covers mais subversivo do rock nacional

THALES DE MENEZES
DE SÃO PAULO

RADIOLA NZ VOLUME 1 (ótimo) * * * * *
QUANTO: em cd (r$ 30) e em plataformas de streaming
AUTOR: Nação Zumbi
GRAVADORA: independente

Álbuns de versões, principalmente quando o repertório é focado em canções clássicas, tendem a uma das duas: reverenciar com respeito o material original ou subverter os trabalhos, às vezes correndo o risco de ultrapassar o limite do aceitável.

A Nação Zumbi tem agora seu momento cover, e aposta numa desconstrução inteligente de faixas memoráveis do rock e da MPB.

"Radiola NZ Volume 1" é o mais subversivo entre os projetos de bandas do rock nacional que já dedicaram discos inteiros a covers. Não é pouca coisa. Entre outros, a lista tem Titãs ("As Dez Mais"), Ira! ("Isso É Amor"), Barão Vermelho ("Álbum") e Kid Abelha ("Coleção"), com resultados irregulares.

O disco da Nação Zumbi tem nove faixas que não escondem a ousadia musical da banda pernambucana atrás de melodias muito conhecidas em álbuns de Gilberto Gil, Roberto Carlos, Tim Maia, Beatles e David Bowie.

"Refazenda" abre o disco e a banda trocou a leveza da versão original de Gilberto Gil por um peso afro. Os metais da Orkestra Rumpilezz, de Letieres Leite, marcam uma faixa densa, na qual a guitarra quase heavy metal de Lucio Maia se encaixa perfeitamente.

Maia também deixa pesada a reinterpretação de "Balanço", de Tim Maia. A música ganha contornos roqueiros bem atraentes.

Mais percussiva e também mais pesada é "Amor", canção cheia de suingue do Secos & Molhados que tem vocais divididos entre Jorge dü Peixe e Ney Matogrosso.

No último Rock in Rio, Ney se apresentou com a Nação cantando canções do Secos & Molhados, numa espécie de prévia do projeto de covers.

"Não Há Dinheiro que Pague", de Renato Barros, foi sucesso nacional com Roberto Carlos em 1968 e teve versão respeitosa do Barão Vermelho em 1996. Agora a Nação Zumbi dá sua cara, com destaque para o baixo de Dengue e o órgão de Mauricio Fleury.

O mesmo Fleury imprime sonoridade peculiar a "Do Nothing", canção ska gravada em 1980 no segundo álbum do grupo inglês The Specials.

Em seguida, a banda desmonta de vez "Dois Animais na Selva Suja da Rua", de Taiguara (1945-1996). A bateria de Pupillo e mais quatro tambores conversam com o moog de Carlos Trilha, num resultado balançado.

BEATLES PSICODÉLICO

Desafio maior fica para "Tomorrow Never Knows", dos Beatles. A música de Lennon & McCartney já teve diversas regravações. A Nação pisa fundo numa quase psicodelia e algum flerte com sons orientais. Ficou bonito, mas talvez seja a versão mais comportada do álbum.

As duas faixas de "Radiola NZ Vol. 1" mais inusitadas fecham o disco. "Sexual Healing" foi o último grande sucesso de Marvin Gaye (1939-1984), e com a Nação se transforma em algo menos soul e mais pop. Se fosse preciso eleger um single para representar a proposta do álbum de covers, eis uma grande candidata.

Já "Ashes to Ashes" consegue surpreender mesmo nestes tempos em que todo mundo resolveu regravar David Bowie (1947-2016). A guitarra de Lúcio Maia encorpa a econômica versão original e tem um peso que Bowie provavelmente aprovaria.

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.