ISABELLA MENON
DE SÃO PAULO

Sob curadoria de Jacopo Visconti, a exposição "Matriz do Tempo Real" abre a agenda de 2018 do Museu de Arte Contemporânea (MAC).

Como no quadro "O Penélope, o Recruta, o Aranha" (1991), do artista plástico Leonilson (1957-1993), a proposta da instituição é abordar as diferentes formas de expressão sobre o tempo.

Vítima de Aids, o cearense morreu aos 36 anos e deixou marcada em suas obras finais a relação com o tempo. Como no trabalho citado, em que bordou o número 34, em referência à idade que tinha à época, e cravou também, em lona, palavras que remetem ao tempo, como "Penélope".

O nome faz referência a uma personagem da mitologia grega. Penélope casou-se com Ulisses, grande guerreiro da epopeia grega. Depois de um ano de casados, ele partiu para a Guerra de Troia, deixando sua amada.

Durante sua longa ausência, a maioria das pessoas acreditava que ele tinha morrido. Penélope, porém, esperou a volta do marido.

Para não ser importunada por pretendentes, ela alegava que precisava terminar de tecer uma tela. Durante as noites, porém, desfazia o trabalho feito de dia.

A maneira que a clássica personagem encontrou para ganhar tempo guarda paralelo com a maneira como o artista lutava contra a doença: cada momento ganho era crucial para sua vida.

TEMPOS DISTINTOS

O objetivo da exposição é incitar reflexões, como na obra de Leonilson. Isso explica a escolha por evitar um caráter "linear e óbvio" na exposição, explica Visconti.

"Cada obra aborda o tempo de uma maneira", ele diz. Entre os 40 trabalhos ali expostos, estão os de artistas como David Lamelas, Artur Barrio e Ivens Machado.

Os temas variam do ponto de vista da reflexão filosófica, como em um sentido processual, até os dias levados para a realização do trabalho.

No sentido filosófico, encaixam-se artistas como John Cage, que "interpreta" a música "4'33" em silêncio durante quatro minutos. A proposta do artista era de chamar atenção aos ruídos da plateia, que também seriam considerados parte da música.

Já a brasileira Ana Amorim apresenta sua série "Days", que leva à superfície o tempo do processo criativo: durante um ano, ela desenhou mapas do seu dia a dia que estarão expostos em uma das paredes da exposição.

Além do trabalho, Ana pretende fazer performances silenciosas, em dias alternados, durante as quais ela contará em uma caderneta todos os segundos transcorridos.

Outro destaque na exposição, o japonês On Kawara (1934-2014) produziu seu trabalho de maneira semelhante. A obra exposta, chamada "Sep.27, 1984", é parte da série "Todays", feita durante décadas e composta apenas de trabalhos realizados ao longo de um único dia.

"Se o trabalho demorasse mais que um dia, ele jogava fora", explica Visconti.

Nas obras que compõem a série, os dias são classificados como anônimos: Kawara não os reproduzia apenas por pertencerem a uma data especial. "É a ideia de um tempo totalmente homogêneo que nem por isso deixa de ter algum valor", diz o curador.

Para ele, Kawara sintetiza a exposição, já que "a maioria das obras transmite a ideia de força do tempo por si só e não por meio de algum acontecimento importante".

MATRIZ DO TEMPO REAL
ONDE MAC, av. Pedro Álvares Cabral, 1.301; tel. (11) 3091-3031
QUANDO até 18 de março; ter., das 10h às 21h, e qua. a dom., das 10h às 18h; grátis

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