Primeira Guerra inaugura esforço diplomático global com Liga das Nações
Impulsionados pela destruição e desilusão causadas pela Primeira Guerra Mundial (1914-1918), as principais nações do mundo se reuniram em um inédito esforço de cooperação global para formar a Liga das Nações. Entre elas estava o Brasil, que teve uma participação pequena e mais focada em questões domésticas que na paz mundial.
"As milhões de mortes causadas pela guerra geraram indignação e revolta nas pessoas. As aspirações pacifistas ganharam força e a guerra passou a ser vista como um mal que não deveria se repetir", afirma o diplomata Eugênio Vargas Garcia, professor do Instituto Rio Branco.
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Liga das Nações, que antecedeu a ONU |
Em janeiro de 1919, as potências vencedoras do conflito reuniram-se em Versalhes, nos subúrbios de Paris, para negociar um acordo de paz. Um dos pontos do amplo tratado referiu-se à criação de uma entidade multinacional, cujo papel seria o de assegurar a paz e impedir que um conflito de tais proporções voltasse a acontecer.
Assim, em 1920, 42 países, entre eles os vencedores do conflito Estados Unidos, Inglaterra e França-- e outras nações aliadas, se uniram na primeira assembléia geral da Liga das Nações. A organização, com sede na neutra Suíça, tinha o poder de mediar negociações e instaurar sanções para forçar um acordo pacífico para os confrontos.
"Já havia claros incentivos para as pessoas evitarem guerras, havia esforços para levar as pessoas a tratados, mas a Liga das Nações levou a negociação a um outro nível", avalia o historiador Cristopher Capozzola, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts.
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O presidente Woodrow Wilson |
E os Estados Unidos, que saíram da guerra como a nova potência mundial, tiveram papel central nos esforços de criação --assim como no fracasso-- da Liga.
O presidente americano à época, o democrata Woodrow Wilson (1913-1921), foi o principal personagem na criação da Liga com os 14 pontos apresentados diante do Congresso americano em janeiro de 1918.
A proposta incluía a devolução das terras tomadas pelos alemães, um esforço de abertura comercial e diplomática entre os países e a criação da Liga. Contudo, foi rejeitada pelos senadores americanos ainda influenciados pelo isolacionismo que tardou a entrada do país no conflito.
"Os americanos saíram da guerra não convencidos de que queriam continuar com o trabalho pesado que a paz internacional exigia", explica Capozzola. "E assim Wilson saiu como a grande figura da Liga, mas também como seu maior derrotado".
ONU
Embora criada para instaurar a diplomacia entre os países e evitar um novo confronto mundial, a Liga das Nações acabou enfraquecida diante da ausência dos Estados Unidos --a nova grande potência mundial-- e teve sua ação restrita a algumas disputas bilaterais.
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Primeira Assembléia Geral da ONU, em 1946 |
"Manter um cenário de paz mundial exige muito trabalho. Os líderes das nações, ainda carregados de ressentimentos pelas perdas da guerra, devem não apenas concordar entre si, mas convencer a população de seus países de que aquilo é o melhor", explica Vargas.
Em 1938, a Alemanha nazista invadiu a Áustria e a Liga não conseguiu evitar a escalada de um novo confronto. Um ano depois, quando começa a segunda Guerra Mundial, a Liga já havia se transformado em uma organização meramente simbólica.
"A Segunda Guerra foi o mais claro sinal de que os esforços da Liga não funcionavam. Mas, de qualquer forma, marcou um esforço diplomático que inspirou a criação da ONU após o fim do conflito", diz professor Capozzola.
Marco Castro /Efe |
63ª Assembléia Geral da ONU, em Nova York |
A ONU (Organização das Nações Unidas) nasceu, portanto, do fracasso da Liga das Nações --extinta uma cerimônia oficial logo após a Segunda Guerra-- e com o objetivo de fortalecer as potências oriundas do conflito com a criação do Conselho de Segurança. Anos mais tarde, com o fim da Guerra e o relativo sucesso em evitar um confronto armado, a ONU se fortalece como entidade de ação global e amplia sua ação a diversas questões humanitárias.
"Hoje vemos a ONU como um ator de papel próprio nas relações internacionais e em questões humanitárias. Contudo, é importante ressaltar que a sua rotina é impregnada de questões de poder e política e ainda depende da vontade de seus países membros para que funcione", afirma Vargas. "Ela é uma organização humana e como tal é imperfeita e sujeita a constante avaliação".
Brasil
Mesmo tendo uma participação pequena na Primeira Guerra, o Brasil foi uma das nações convidadas para a Conferência de Paz de Paris que estabeleceu os esforços para a Liga das Nações.
O governo enviou o jurista e senador Epitácio Pessoa como chefe da delegação brasileira. Pouco depois, ele seria eleito presidente da República. "Pessoa foi representar os interesses brasileiros na reunião que envolviam questões comerciais e menores que o objetivo central dos países europeus em definir a paz", conta Vargas, autor do livro "O Brasil e a Liga das Nações".
Em cooperação com a delegação americana, Pessoa conseguiu garantias para o reembolso do dinheiro depositado em um banco da Alemanha, então destruída economicamente pelo conflito. "O dinheiro vinha da venda do café que o Estado de São Paulo tinha estocado em alguns portos europeus como garantia de dois empréstimos", conta o diplomata.
Outra questão, mais complexa, era a posse dos navios alemães que o Brasil havia tomado após romper relações diplomáticas com Berlim, em 1917. Na Conferência, ficou decidido que os navios seriam partilhados entre os aliados de acordo com suas perdas durante a guerra.
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