'Ser artista em SP exige disciplina', dizem gêmeos criadores de quadrinhos
Em seu estúdio na Vila Madalena, os gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá, 36, criam histórias em quadrinhos que são exportadas para o mundo inteiro. Atualmente, trabalham na série para o mercado americano "BPRD Vampire" e na adaptação do romance "Dois Irmãos", de Milton Hatoum.
Conhecidos na cena independente paulistana desde 1997, quando faziam o fanzine "10pãezinhos", vendido a R$ 0,50, eles conquistaram espaço para as narrativas longas, diferentes das tiras rápidas que deram fama à geração anterior.
Em destaque na mostra "HQBR21 - O Quadrinho Brasileiro do Novo Século", com páginas originais de "Daytripper", a dupla diz enxergar beleza em São Paulo. "É uma cidade charmosa", afirma Moon.
sãopaulo - Como era a São Paulo das primeiras histórias que vocês criaram?
Gabriel Bá - No primeiro "10pãezinhos", colocávamos o universo dos amigos, mas o visual era parecido com o tipo de gibi que líamos. Era como usar o cenário do Homem-Aranha para contar uma história aqui. Demorou para conseguirmos retratar a rua Cardeal Arcoverde.
Qual a principal influência das HQs na forma de vocês verem São Paulo?
Fábio Moon - O desenho de Laerte é o que mais influenciou o nosso. Ele construía paisagens que a gente reconhecia: fios elétricos emaranhados, calçadas rachadas. Descobrimos como criar um mundo com poder sobre o leitor, mesmo que a história tenha pontos surreais.
São Paulo tem vocação para ser cenário de narrativas longas?
Bá - Os personagens paulistanos moram sozinhos e buscam alguém para ser seu grande amor nessa cidade cheia de gente. Além disso, as pessoas têm uma relação forte com o trabalho em São Paulo. São elementos que dão pano para manga para narrativas longas.
O que mudou na cena independente desde 1997?
Moon - Antes estávamos em uma ilha deserta. A produção era pré-internet. Tínhamos que explicar nosso trabalho com um esforço de guerrilha. Criamos o fanzine para mostrar que HQ não precisa ter humor nem super-herói. Pode ser história de gente normal, que trabalha, vai ao bar e se apaixona.
Bá - O mundo da gráfica mudou. As pessoas não fazem mais fanzine de xerox. O independente alcança um resultado fino, próximo da arte.
Acham São Paulo bonita?
Moon - É uma cidade charmosa. Às vezes ela se produz demais, sem saber o que combinar com o quê. Se você aguenta as dificuldades que ela impõe, acaba descobrindo seu charme.
Como aproveitam o tempo livre?
Bá - Tempo livre é novidade para a gente. Ficamos dez anos, até 2007, fazendo quadrinhos de graça e mantendo outros trabalhos para pagar as contas. Até hoje, às vezes trabalhamos 12 horas por dia. No fim da semana aproveitamos para andar pela Vila Madalena e ver os amigos. Ser artista em São Paulo exige muita disciplina.