Escritor e diplomata, mestre em direito (Harvard). Serviu na missão na ONU e no Chile, EUA, México e Japão. É autor de "Sergio Y. vai à América" (Cia das Letras).
Tiro no pé
Não é nada pessoal, mas, enquanto você lê este parágrafo, tem gente em todas as chancelarias do mundo detestando a ideia de comparecer à posse da presidente Dilma Rousseff.
Em condições normais, seria uma alegria assistir a uma cerimônia festiva em um país simpático. Acontece que a Constituição de 1988 estabeleceu a data da posse presidencial em 1º de janeiro.
Ou seja, razão para essa má vontade internacional nós mesmos criamos: quem acha graça em passar o Réveillon trabalhando, distante dos amigos e da família?
Quando a Constituinte tomou essa decisão, pretendia que as datas do mandato presidencial coincidissem com as do exercício fiscal, de 1/01 a 31/12. Administrativamente, faz sentido. Do ponto de vista diplomático, no entanto, pouca coisa é mais inconveniente.
Fazer uma cerimônia de posse coincidir com uma das datas mais festejadas do mundo é dar tiro no próprio pé. Se fosse uma cerimônia apenas para brasileiros, menos mau, seriam nossas idiossincrasias, os prejuízos ficariam por aqui. Mas convidam-se praticamente todos os chefes de Estado, que comparecem ou mandam representantes.
O legislador brasileiro parece ter esquecido que uma das funções da posse presidencial é diplomática. Em termos de política externa, o evento permite uma série de contatos diretos entre autoridades governamentais de alto nível. As delegações que comparecem encontram-se com suas contrapartes e várias sinergias se iniciam.
Também serve como laboratório para avaliar o nível de importância que os países atribuem à relação com o Brasil. Os Estados Unidos, por exemplo, que estão com o filme queimado depois de terem espionado o celular da presidente, vão mandar o vice-presidente Joe Biden, em lugar da então secretária de Estado, Hillary Clinton, que veio à posse do primeiro mandato de Dilma.
Naquela ocasião, 23 chefes de Estado ou governo compareceram. Não é pouca coisa, mas poderiam ser muitos mais. Países que gostariam de se representar em nível adequado acabam não o fazendo dada a inconveniência da data.
Impor uma posse presidencial aos países amigos no primeiro dia do ano é um ato no mínimo inconveniente, que denota pouca noção de como se conduzem as relações diplomáticas. Como inspirar boa vontade em alguém que você forçou a abandonar a família durante as festas de fim de ano? É quase convidar para piquenique na chuva. Para o empossado, trata-se de um mau começo.
O legislador errou ao negligenciar o potencial político do evento, mas pior que errar é persistir no erro. Existe, sob exame do Congresso, uma PEC de autoria do senador José Sarney que propõe, entre outras, a mudança da data da posse para 10 de janeiro. Sabe quando falam de aperfeiçoamento democrático? Isso também faz parte.
A posse é uma cerimônia custosa aos cofres públicos. Deve ser aproveitada em todo o seu potencial, inclusive diplomático. O Brasil merece que o Congresso aprove a proposta de emenda à Constituição prontamente e que Dilma Rousseff seja o último presidente brasileiro empossado na ressaca do Réveillon.
Livraria da Folha
- Coleção "Cinema Policial" reúne quatro filmes de grandes diretores
- Sociólogo discute transformações do século 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade
Comentários
Ver todos os comentários (6)Master
14/12/2014 20h15 DenunciarMarcant
13/12/2014 13h40 DenunciarVocê é uma pessoa tão ou mais dissimulada que a Dilma e a Graça, queridinho. E é menos mal e não menos mau. Pethebas são reconhecidos pela má instrução. É o que dá odiar a escola.Eu quero ser o califa no lugar do califa (isnogood, lembram-se?).
ZAC
13/12/2014 13h30 DenunciarVc acha que com toda essa lama alguém de peso virá?
Em Colunistas
- 1
Mônica Bergamo: Sanção de Trump a Moraes é inadmissível e gerará solidariedade, dizem ministros do STF
- 2
Mônica Bergamo: Academia Brasileira de Ciências pede que Tarcísio retire projeto que extingue carreira de pesquisador
- 3
Adriana Fernandes: Fila recorde do INSS mostra Previdência largada
- 4
Mônica Bergamo: Mello Araújo e lojistas fazem ato após esvaziamento da cracolândia e querem 'pessoas do bem' na região
- 5
Drauzio Varella: Os problemas do excesso de exames
Alexandre está certíssimo. Antes de se tratar de posse do partido A ou B, é a nossa diplomacia e o nosso dinheiro que estão em jogo. Transfiram, nas próximas vezes, para o dia 15 de janeiro, ou antecipem para 15 de dezembro, é a minha sugestão.