
É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.
Paternalismo libertário
SÃO PAULO - No final, a obrigatoriedade de as montadoras instalarem airbags e freios ABS em todos os veículos novos foi mantida. Fico feliz, mas não resisto a levantar uma interessante e até certo ponto incômoda discussão filosófica.
Até que ponto o Estado pode interferir em transações voluntárias entre vendedores e compradores? No caso dos freios, é decerto legítimo tornar o sistema ABS um item de fábrica. Um veículo que não consegue parar, afinal, representa ameaça não só para o motorista e seus passageiros como também para terceiros. Mas será que esse raciocínio vale para o airbag?
Não me parece absurdo que alguém dispense esse item em troca de preço menor no automóvel. Vale observar que o poder público admite que motociclistas circulem sem esse tipo de proteção. Além disso, atividades bem mais perigosas, como alpinismo de altitude e mergulho em cavernas, são perfeitamente legais.
A discussão é análoga à da obrigatoriedade do cinto de segurança. Cabe ao Estado impedir que um cidadão faça mal a si mesmo? Meus instintos libertários dizem que não, mas meu pendor consequencialista sugere que sim. Trata-se, afinal, de interferência pequena que salva vidas.
Há um meio de conciliar essas duas intuições, recorrendo ao "paternalismo libertário" proposto por Richard Thaler e Cass Sunstein. A ideia aqui é reconhecer que seres humanos frequentemente fazem escolhas erradas e, através de desenhos institucionais, tentar empurrá-los para as certas, mas sem autoritarismo.
No caso do airbag e do cinto, em vez de coagir, bastaria exigir do interessado que assine meia dúzia de formulários isentando fabricantes e o Estado de qualquer responsabilidade por sua escolha. Como o viés de inércia é forte, o mais provável é que um número reduzido de libertários obstinados se desse ao trabalho. As virtudes públicas da obrigatoriedade são conservadas, e a liberdade individual, preservada.
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Comentários
Ver todos os comentários (6)AA
21/12/2013 16h04 DenunciarAdriano
21/12/2013 11h11 DenunciarCaro Hélio Schwartsman, concordo com a opção de abrir mão de airbag, porém esra deveria ser acompanhada de isenção de gastos públicos com ambulância, helicóptero, hospitais etc em caso de acidente. Entendeu onde quero chegar? É igual aquela fórmula que encontraram: as secretarias de saúde economizam dinheiro se investirem em saneamento básico, que é atrelado à secretaria de obras. Talvez o governo enxergou economia na previdência e UTIs evitando mortes. Fica a reflexão!
Lucas
21/12/2013 09h46 DenunciarNão há uma escolha 100% livre, já que a formação das preferências é sempre condicionada. Como no exemplo do buffet em uma cafeteria, a própria escolha da ordem das comidas ou de quais estarão disponíveis aos consumidores é um limitador relevante da autonomia de escolha. Enfim, até que ponto não usar cinto de segurança é uma escolha livre e racional, que mereça, de fato, ser preservada? E o que dizer de seguros como DPVAT e o próprio INSS? Há uma perda de liberdade fruto de sua imposição?
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Será q o carro do acidente com o ator de Velozes e Furiosos tinha freio ABS e airbag? . E os carros dos milhares de acidentes no Brasil com vítimas fatais tinham freio ABS e airbag? . E destes acidentes qtos foram cometidos por gente q ñ tinha tomado uma cerveja? . Os q querem "transformar o mundo" vão continuar a proibir milhares de coisas até chegarem a "ser humano virtuoso", no mundo atual essas criaturas insanas dominaram de forma avassaladora e apenas uma nova era jogará essa ralé no lixo.