É pesquisadora-sênior na Lyndon B. Johnson School of Public Affairs, da Universidade do Texas, em Austin (EUA).
A morte da estratégia
Resisto há muito tempo ao argumento superficial de que exista uma divisão fundamental na América Latina –esquerda/direita, vegetariano/carnívoro, bitolado/liberal, Estado/mercado, democrático/populista, Pacífico/Atlântico.
Essas correspondências rendem frases curtas de impacto, fáceis de digerir, mas geralmente deixam pouca margem para o claro-escuro, a área cinzenta em que a vida nacional e internacional ocorre de fato.
Sobretudo, a partir de onde estou sentada (literalmente), a apenas uma quadra da Casa Branca e a mais ou menos dois quilômetros do Capitólio, ainda me espanto com a dificuldade de Washington em elevar-se acima desses refrões.
Nas raras ocasiões em que de fato lida com a América Latina, a Casa Branca faz um trabalho muito melhor que o Congresso, reconheço.
Mas, como o Congresso controla as verbas e a confirmação de embaixadores e figuras seniores do governo, ainda enfrentamos uma falência da imaginação e da vontade política em Washington.
Em vez de uma estratégia para a América Latina baseada em interesses, temos grande número de pequenos programas, iniciativas e "parcerias", com pequenos orçamentos administrados por indivíduos de várias agências do Executivo aos quais, de modo geral, falta um quadro estratégico abrangente que venha de cima.
Sim, sim: secretários do gabinete e nosso dinâmico vice-presidente fazem muitas viagens à região, e a crise do momento (hoje em dia, a América Central) ganha atenção porque repercute diretamente sobre a política doméstica –imigração. Mas modo de crise e milhas aéreas não formam uma estratégia.
Não estou falando em uma "estratégia de contenção" ao estilo de George Kennan. O mundo, incluindo a América Latina, é complicado demais para algo tão simples.
Mas o que dizer de diretrizes básicas, assentadas sobre uma avaliação realista de nossa interdependência, nossas linhas de falha e oportunidades que isso encerra?
Na ausência de um quadro estratégico, as mulheres e os homens responsáveis pelas políticas para a região são forçados a agir mais como responsáveis por programas de fundações filantrópicas, vasculhando a região em busca de destinatários aceitáveis dos recursos minguantes de um patrono financeiro repreendedor, arbitrário e politizado.
Existe outro problema, e aqui vou revelar minha idade. Um amigo meu que durante anos trabalhou com política para a América Latina em várias agências do governo observou que faltam aos burocratas políticos de Washington nascidos desde a era Reagan (1981-89) ferramentas básicas de discernimento e análise.
Ui! Ele não estava expressando saudades da Presidência de Reagan, embora o bipartidarismo da época seja inexistente hoje. Creio que o que ele quis dizer é que Washington era uma cidade onde as ideias, e não apenas a ideologia, importavam, mesmo que um pouco.
Hoje a cidade é suscetível ao discurso simplista porque, lamentavelmente, para avançar profissional e politicamente é preciso sucumbir linguisticamente –logo, intelectualmente– à tirania da tática.
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