
Laura Carvalho é professora do Departamento de Economia da FEA-USP com doutorado na New School for Social Research (NYC). Escreve às quintas-feiras.
Quem paga o pato?
A Fiesp oficializou na segunda-feira seu apoio ao impeachment da presidente Dilma Rousseff, fundada, segundo ela, em uma pesquisa que realizou com 0,7% das empresas do Estado.
A decisão da Fiesp já havia sido antecipada na véspera: símbolo de sua campanha pela redução de impostos, seu pato serviu para alegrar as muitas crianças que passeiam pela Paulista aos domingos.
Mas as ações da federação também servem para deixar clara a origem de vários dos erros de política econômica cometidos pelo governo Dilma desde seu primeiro mandato.
Os dados apresentados por Rodrigo Orair no "Texto para Discussão" número 2.117 do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) mostram que a carga tributária brasileira, que subiu cinco pontos percentuais –de 27% para 32% do PIB– entre 1995 e 2002, chegou ao patamar de 33,7% em 2007, mas se manteve relativamente estável desde então.
O estudo esclarece, entretanto, que o que aumentou a arrecadação entre 2005 e 2014 foram os tributos sobre a folha de pagamentos e os rendimentos do trabalho, devido à expansão da massa salarial e do nível de emprego formal no período. Os impostos sobre o lucro das empresas e sobre bens e serviços, ao contrário, contribuíram para uma redução da carga tributária de 2,3 pontos percentuais.
Na realidade, o setor empresarial foi o maior beneficiado pela expansão fiscal do primeiro governo Dilma Rousseff, que se deu essencialmente pela via das desonerações tributárias e outras formas pouco criteriosas de subsídios às suas margens de lucro. Desonerações que, diferentemente dos numerosos itens aprovados no ajuste fiscal de 2015, que já bateram –direta ou indiretamente– no bolso dos trabalhadores, ainda não foram eliminadas pelo Congresso.
Além disso, assim como em quase todos os países da OCDE, até 1995 também se tributavam dividendos no Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) no Brasil. De acordo com outra pesquisa recente de Orair e Gobetti do Ipea, essa isenção de IRPF sobre os lucros convertidos em renda pessoal é o principal fator que explica por que os brasileiros que ganham mais de R$ 1,3 milhão por ano pagam apenas 6,7% em impostos, em comparação a uma média de 11,8% pelos que ganham entre R$ 162,7 mil e R$ 325,4 mil.
Uma reforma tributária que vise reduzir impostos sobre o consumo e a produção, e elevar impostos progressivos sobre a renda e o patrimônio, seria muito bem-vinda. O mesmo vale para uma política industrial estratégica.
Esses não parecem, no entanto, ser os verdadeiros alvos da campanha "Não vou pagar o pato", da Fiesp, que, aliás, vem sendo muito eficaz no cumprimento de seu objetivo. O pato quem vem pagando é o resto da população, ora cedendo suas fatias no bolo cada vez menor do Orçamento público, ora sofrendo as consequências da atuação política da entidade.
A federação pode não ter sido tão sincera quando, acusada pela Comissão Nacional da Verdade de seu envolvimento com os crimes da ditadura militar, declarou, por meio de nota oficial, que sua atuação tem se pautado pela defesa da democracia e do Estado de Direito.
Seus membros mais afoitos devem ser avisados de que, desta vez, podem não contar com o apoio nem do governo americano nem de nossas Forças Armadas para o desmonte das instituições democráticas brasileiras.
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Comentários
Ver todos os comentários (19)Patrick
18/12/2015 09h31 DenunciarJOAO
18/12/2015 00h48 DenunciarO texto apresenta uma visão grosseira sobre o papel dos impostos na economia. Os impostos sempre atuam sistemicamente. Retiram renda do setor privado, reduzindo, então, o poder de compra de todos os setores. Portanto, a FIESP, como representante do setor produtivo tem motivos e competência para reclamar de TODOS os impostos. De toda a carga tributária!
JOAO
17/12/2015 23h30 Denunciarempre atuam sistemicamente. Retiram renda do setor privado, reduzindo, então, o poder de compra de todos os setores. Em outras palavras, os impostos sobre produtos industrializados não afetam apenas a indústria. Os impostos sobre a folha de pagamentos não afetam apenas os trabalhadores. Os impostos sobre os dividendos são impostos em duplicata, pois o lucro das empresas já foi taxado. Os impostos sobre os juros dos títulos públicos são uma estultice, pois só fazem exgir maiores taxas de juros.
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Não será necessário recorrer ao exército, a incopetência deste governo, a corrupção como regra, a falta de capacidade em pensar em soluções alternativas e a reprovação de mais de 70% da poupulação são o suficiente para nos vermos livres dessa gente que jogou o país em sua pior crise econômica da história, e parece que ainda não chegamos ao fundo do poço, eles são capazes de cavar um pouco mais, ainda considerando a saída da única cabeça pensante deste governo, o ministro Levy, coitado do Brasil.