editorial
A direção de Temer
Dadas as circunstâncias atípicas, o presidente interino Michel Temer (PMDB) dispunha de espaço pequeno para escapar às platitudes durante seu primeiro discurso após o afastamento provisório de Dilma Rousseff (PT).
Eram por assim dizer obrigatórias as referências à difícil situação econômica e à necessidade de instituir um governo de salvação nacional, à Operação Lava Jato e ao compromisso de mantê-la sempre protegida, ao processo traumático em curso e à busca pelo constante diálogo com a sociedade.
Procurando ir além do óbvio, mas ainda assim sem oferecer novidades, Temer fez de tudo para se distinguir de Dilma. Da fala concatenada ao tom moderado, dos recados a empresários aos sinais a investidores, das mesuras aos parlamentares à insistência no legalismo, em tudo o interino se distanciava daquela a quem substitui.
Em nenhum tema realçou mais as diferenças, porém, do que quando tratou do papel do Estado. Fato digno de nota, assumiu sem rodeios um discurso liberal, estabelecendo vagos limites para o poder público e enaltecendo a importância das parcerias com o setor privado para que o país volte a crescer.
Em termos práticos, contudo, não indicou como pretende levar tais planos adiante, assim como não destacou medidas objetivas relacionadas com as poucas reformas que enumerou, caso da trabalhista e da previdenciária.
Argumente-se que a cerimônia não comportava riqueza de detalhes. O dia de Temer, entretanto, não se fez apenas do pronunciamento. Havia também um momento concreto: a posse daqueles que integrarão seu primeiro escalão —e o ministério do presidente interino se revelou decepcionante.
À exceção de um ou outro nome de peso, o peemedebista se valeu do mesmo loteamento de cargos que a sociedade tanto criticava na gestão petista. Áreas sensíveis para a população, como educação e saúde, foram usadas como moeda nas negociações fisiológicas.
Não se trata de ignorar as imposições do pragmatismo político; algumas concessões o presidente interino inevitavelmente haveria de fazer. Mesmo no balcão do toma lá dá cá, todavia, era possível encontrar quadros de maior expressão —já que o gabinete de notáveis não passou de balão de ensaio.
Erro ainda mais primário Temer cometeu ao não nomear nenhuma mulher para seu ministério. Nem tanto por ajudar Dilma em sua narrativa de vítima do machismo, mas pelo retrocesso de décadas que a atitude representa —basta lembrar que o último gabinete composto somente por homens remonta à década de 1970, na ditadura militar.
Durante seu discurso, Michel Temer recorreu a palavras como credibilidade e confiança. Não se pode dizer, ao menos por ora, que sua prática as inspire.
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Comentários
Ver todos os comentários (29)CALÃ
13/05/2016 22h08 DenunciarMauro Tadeu
13/05/2016 17h32 DenunciarNão menos simbólica, a ausência da reforma partidária na fala do atual presidente.
Spina
13/05/2016 13h05 DenunciarO PMDB é governo desde que a Dilma foi eleita em 2010. Também é responsável por essa crise sem precedentes na história do país. Diretas já.
Claro que tem mulher e negros no Ministério de Temer. No Brasil cor é autodeclarada e segundo a ideologia de gênero qualquer ministro pode ser uma mulher apesar de terem órgão sexual masculino, portanto, qualquer ministro pode ser uma mulher e negra.