Jornalista esportivo desde 1971, escreve sobre temas olímpicos. Participou da cobertura de seis Olimpíadas e quatro Pan-Americanos. Escreve às terças.
Após os Jogos do Rio, castelo de areia do esporte olímpico desaba
Fabrice Coffrini/AFP | ||
O presidente do COB e do Comitê Rio-2016, Carlos Arthur Nuzman, no encerramento dos Jogos |
O Brasil foi palco da Olimpíada-2016, que envolveu gastos estimados em cerca de R$ 40 bilhões. O balanço ainda não foi fechado. Embora realizado com sucesso, o fim do evento desgraçadamente coincidiu com a economia nacional enfrentando uma das piores crises de sua história. O esforço valeu a pena para o esporte nacional?
A julgar pelas declarações na semana passada do presidente do COB (Comitê Olímpico do Brasil), Carlos Arthur Nuzman, parece que não. Sem qualquer constrangimento, Nuzman em entrevista coletiva afirmou que " a partir de agora, a gente volta ao que era antes de Sydney-2000".
Então, o esporte brasileiro está de volta à década de 90? Declaração macabra, mas inquietante se levadas em conta as duas décadas do próprio Nuzman na liderança do COB.
Além disso, ele acumulou o comando do Comitê Rio, responsável pela organização da Olimpíada, e recentemente se lançou candidato à presidência da Odepa (Organização Desportiva Pan-Americana).
Quando assumiu a presidência do COB, em junho de 1995, ele já tinha um discurso ambíguo sobre continuísmo nas gestões esportivas. Era contra, embora seu currículo registrasse 20 anos na chefia da CBV, a gestora do vôlei nacional. O sucesso alcançado pela modalidade, no entanto, amenizava a contradição.
Nada impedia à época declarações sugerindo que o esporte brasileiro estava apenas decolando para o patamar de potência olímpica.
Um ano depois de Nuzman assumir o poder no COB, o Brasil foi a Atlanta e, pela primeira vez, ultrapassou a marca de dez medalhas. Ganhou 15, três de ouro, também um registro inédito.
Arrebatou ainda seus primeiros pódios olímpicos no feminino, com destaque para o ouro de Jacqueline Silva e Sandra Pires e a prata de Mônica Rodrigues e Adriana Samuel, no vôlei de praia, que estreava na Olimpíada. As mulheres ficaram também com a prata no basquete e o bronze no vôlei de quadra.
Nuzman, espontaneamente, reconheceu que aquela campanha praticamente nada tinha a ver com sua gestão, pois assumira o posto quando a preparação da delegação estava encaminhada.
Ocorre que, de lá para cá, a evolução foi modesta. O ápice, como era de se esperar, aconteceu em casa, no Rio. Chegou a 19 medalhas, sete delas de ouro, mas sem atingir a meta de colocar a delegação entre as dez mais laureadas dos Jogos, como vislumbrava o COB.
Terminou em 12º lugar pelo total de medalhas. Em contrapartida, os brasileiros foram ao pódio em 12 esportes, um patamar superior ao das Olimpíadas anteriores.
Após o encerramento dos Jogos, aos poucos as incertezas começaram a despontar. Com o galope da crise econômica, minguaram os patrocínios, antes abundantes pela exposição na vitrine da Olimpíada. Sólida, restou a Lei Piva, sancionada em julho de 2001 e que destina 2% das loterias federais ao COB e ao Comitê Paraolímpico.
No último dia dos Jogos no Rio, Nuzman chegou a rebater questionamento sobre a sua permanência no comando do COB –logo depois foi eleito para a sexta gestão consecutiva–, insinuando que a larga experiência tinha tido reflexo na organização da exitosa Olimpíada.
Naquele momento, o argumento soava tortuoso e complicado para ser rebatido. A declaração de que o esporte brasileiro volta no tempo, passados apenas sete meses, recoloca um ponto de interrogação nas chances de bons frutos na longevidade em cargos diretivos do esporte.
Está evidente a dependência do setor por verbas públicas cada vez mais generosas e a ausência de uma estrutura sólida para caminhar com as próprias pernas.
A sensação é semelhante à da construção de castelo de areia na praia, que fica à mercê da maré ou de uma óbvia onda mais alongada. Tudo vira simplesmente praia, em segundos.
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