Trabalhou na "Tribuna da Imprensa", em "O Globo" e "O Estado de S. Paulo" antes de ingressar na Folha, em 1991. Passou pelo agora extinto "Folhateen", foi colunista de "Esporte", repórter especial e ombudsman por um ano.
Crônicas do sangue derramado
Padecem do mesmo mal as manchetes da Folha da segunda, "Presa sofre abuso sexual em 5 Estados, diz relatório", e da terça, "80% dos estádios precisam de reformas nas estruturas": as informações, disponíveis muito tempo antes da publicação, só ganharam as páginas depois que tragédias despertaram o interesse nelas.
Desde a primeira quinzena de março, quando foi apresentado à OEA (Organização dos Estados Americanos), o relatório elaborado por entidades de defesa dos direitos humanos já era público -a íntegra está na internet. Mais que reproduzi-lo, o jornal poderia ter palmilhado o país em busca de comprovação da selvageria que ele denuncia.
Pelo contrário, ignorou-o, alçando-o à capa somente após a descoberta da covardia contra uma adolescente de 15 anos detida na mesma cela com homens em Abaetetuba (PA) -sim, uma tragédia.
Já o levantamento sobre as condições de dezenas de arenas foi divulgado em 1º de novembro, em entrevista coletiva, pelo Sinaenco (Sindicato da Arquitetura e da Engenharia). Demorou 26 dias para aparecer no jornal. Para que os leitores o conhecessem, foi preciso que um pedaço da arquibancada da Fonte Nova despencasse no domingo e sete pessoas morressem.
Um mês atrás, o trabalho foi alardeado até em Lisboa. TVs o exibiram. A Gazeta Esportiva.Net descreveu a conclusão sobre as instalações soteropolitanas: "As arquibancadas estão em ruínas e há total falta de segurança e higiene para os torcedores e até jogadores".
A Folha foi transparente sobre o primeiro estudo: datou a entrega à OEA. Omitiu, contudo, que o diagnóstico do Sinaenco fora anunciado mais de três semanas antes. Tingiu-o com verniz de ineditismo.
Noticiar o desmazelo não imuniza contra novas desgraças. O jornalismo, porém, é mais útil quando se antecipa aos fatos: ao mostrar a vida como ela é, permite que se reaja à barbárie (nas prisões) e ao perigo (no futebol). É mais cômodo fotografar o leite -ou o sangue- derramado, em vez da iminência do derrame.
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