Depoimento
'Ninguém entende o drama de não reconhecer um bebê como seu'
Diana Leite Chacon | ||
Viviane Fontinele, que sofreu com depressão pós-parto, ao lado da filha Jordana, com 7 meses de vida |
A experiência negativa de Viviane Fontineli, 36, começou no parto. Hoje ela coordena um grupo do Facebook que ajuda mães que passam pelas mesmas dificuldades. Sua filha Jordana tem 2 anos.
Leia abaixo o depoimento que Viviane deu à Folha.
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"Eu havia planejado um parto normal, sem anestesia, em um hospital. Fiquei 11 horas em trabalho de parto e cheguei até a fase expulsiva, mas a bebê entrou em sofrimento e tive de fazer uma cesárea de emergência.
Ela nasceu saudável, mas a cirurgia atrapalhou meus planos: eu queria ser a mãe perfeita. Mas amamentar a bebê foi complicado. Com o abdome cortado, colocar o bebê no seio é difícil.
A gente precisa de apoio nessas horas e até existem algumas 'consultoras' que só sabem dizer: 'você quer, você consegue'. Eu estava fragilizada, tinha sofrido uma cirurgia invasiva e tive de escutar isso. Será que não tenho vontade?
Nos dias seguintes, a solidão é grande. Será que sou só mãe? Será que não tenho necessidades como ser humano? Todo mundo pergunta do bebê e ninguém se preocupa comigo.
Eu não sabia nada: nunca tinha segurado um recém-nascido e me sentia incapaz de cuidar de um. As pessoas não entendem o que é depressão pós-parto, o drama de não reconhecer um bebê como seu filho, não sentir amor ou achar pode fazer algo de ruim para ele.
Claro que eu amava a minha filha, mas ela era como uma hóspede na minha casa, com a desvantagem de que eu não sabia o que ela queria –não fala, só chora; não sei se sofre...
'Ser mãe é instinto', dizem. Nem sempre. Esse amor também pode ser uma construção.
Após cinco meses, procurei uma psicóloga. Não precisei de medicação. A terapia serviu para eu entender que eu não tinha culpa de me sentir incapaz, que a cesárea foi uma emergência.
Pelas fotos nas redes sociais, parece que a maternidade é sempre cor-de-rosa. Agora se fala mais do 'lado B' da maternidade. Ninguém vê que a mãe não dorme, que a criança está sofrendo com cólica.
Parece tabu: 'nunca vai acontecer comigo'. Tomara que não, mas se acontecer é importante saber que que ela não está sozinha e que é possível se cuidar."
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