"Não sei se Guimarães Rosa é melhor que João Gilberto", diz Chico na Flip
"Eu não sou um bom leitor dos livros do meu pai", disse Chico Buarque. "Eu nunca mais escreverei por encomenda. Nem se me pedirem para escrever um bilhete", disse Milton Hatoum. Com frases assim, que não deixam a memória de quem as ouviu, a Flip (Festa Literária Internacional de Paraty) encerrou sua última mesa desta sexta-feira, que reuniu Chico e Hatoum durante uma hora e meia.
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Danilo Verpa/Folha Imagem |
O cantor, compositor e escritor Chico Buarque lê trecho do seu mais recente livro, "Leite Derramado", durante mesa na 7ª edição da Flip |
Ambos falaram sobre seus livros, da forma como criam suas histórias, do processo de escrita e do tempo que levam para desenvolver e abandonar um livro. Após fazerem leitura de trechos de suas obras mais recentes, na mesa "Sequências Brasileiras", ambos passaram a responder perguntas do mediador Samuel Titan Jr.
Sobre a inspiração para escrever "Leite Derramado", Chico disse que a sua partiu da curiosidade que tem de escrever sempre sobre algo que desconhece. Contou que até escrever "Budapeste", não conhecia a cidade, e que isso, o desconhecimento, de alguma maneira o desperta. O mesmo se passou com "Leite Derramado".
"Eu queria escrever sobre um tempo em que eu não vivi, e o livro se passa em 1929", disse. Chico levou um ano e meio para escrever "Leite Derramado". Depois de terminado, queria esquecer o que fizera, não é do tipo que se prende à obra, muito pelo contrário, sente a necessidade de se distanciar dela. "Quando termino um livro, eu não quero mais saber daquele livro, eu preciso de distância da literatura".
Já Hatoum explicou que engata um livro no outro e que, portanto, a separação de uma obra após ter sido terminada é automática. Sua publicação, "Órfãos do Eldorado", que é uma novela encomendada, teve de ser encurtada. "Eu tinha que escrever cem páginas, mais ou menos. Quando vi, já havia escrito quase duzentas e partia para transformar a novela em romance.".
Questionado pelo público se escrevia seus livros da mesma maneira que compõe suas músicas, e vice-versa, Chico disse que quando está fazendo literatura nem chega perto da música, fica afastado dela, apenas escuta uma música "chata", bem no fundo de sua cabeça, que não o deixa em paz.
Chico gerou risos na plateia ao admitir não ser um bom leitor dos livros de seu pai, o historiador Sergio Buarque de Holanda. "Eu não sou um bom leitor dos livros do meu pai. Não sou. Talvez porque ele seja meu pai, não sei." E causou expressões de espanto e surpresa ao dizer que não sabia se "Guimarães Rosa é melhor que João Gilberto", comparando dois grandes nomes da literatura e da música, respectivamente.
Leia algumas das frases ditas pelos dois autores durante a conversa.
Chico
"Eu não sou um bom leitor dos livros do meu pai."
"Não sei se Guimarães Rosa é melhor que João Gilberto. Eu não sei."
"Quando termino um livro, eu não quero mais saber daquele livro, eu preciso de distancia da literatura"
"Esse cara copiou o meu livro!" [referindo-se a uma brincadeira feita com Hatoum] "Eu sou inocente."
"Eu também" (Milton Hatoum)
"Bom mesmo é ler. Escrever é uma chatice, eu escrevo para ler."
"Todo dia antes de começar a escrever eu pegava o livro e lia desde o começo. Eu tinha o livro na mão."
"Se tirar tudo o que o cara repete o livro todo, ele ia ter 20 páginas."
"Aquele sujeito [o narrador] faz parte da sua vida, eu preciso me livrar dele."
Sobre Chico ter quebrado a perna
"Foi uma vingança do velho" [Hatoum comentando personagem do livro de Chico]
"Não, foi uma lembrança do velho" (Chico)
Hatoum
"Uma novela é um recorte trágico da história."
"Eu sou o mais regionalista dos escritores. Quanto mais regionalista eu me torno, mais sou universal."
"A novela é um açaizeiro pelado."
"Descobri o livro quando descobri qual era o meu título"
"Eu nunca mais escreverei por encomenda. Nem se me pedirem para escrever um bilhete."
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