Crítica: "Germinal", de Émile Zola, incita proletários contra a burguesia
Arnold Hauser, o polêmico historiador da literatura, escreveu que Émile Zola (1840-1902), apesar de seu racionalismo positivista, foi o mais romântico dos naturalistas.
Hauser via no cientificismo unilateral, não-dialético, do romancista francês a ação de um sistematizador romântico, que enxergava em toda parte alegorias, em vez de fenômenos individuais concretos.
Essa provocação germânica faz sentido.
O romance mais celebrado de Zola é na verdade um elo numa corrente. "Germinal" é o décimo terceiro volume da saga familiar dos "Rougon-Macquart", em vinte volumes, iniciada em 1870 e concluída em 1893.
Inspirada na colossal "A Comédia Humana", de Balzac, a saga de Zola traz um subtítulo que não deixa a menor dúvida quanto à sua intenção analítica, científica: "História Natural e Social de uma Família sob o Segundo Império".
"Germinal", publicado em 1885, nasceu como um longo e radical panfleto a favor do movimento operário na França. E foi como um longo e radical panfleto que sobreviveu até hoje.
Muito mais importante do que suas qualidades estritamente literárias, supervalorizadas pela crítica imanente, é o seu sincero engajamento social.
Militância autêntica, sem perífrases nem dissimulação: foi isso que manteve o romance nas livrarias por mais de cem anos.
REVOLTA
"Germinal" narra as condições sub-humanas de vida numa mina de carvão na França, batizada apropriadamente de Voraz.
Étienne Lantier é o militante que organiza a violenta revolta dos mineiros, contra a miséria, a fome e a doença. Em resumo: contra o poderio do capital.
A greve ganha corpo, impõe-se. O capital convoca a tropa armada. Acirram-se os confrontos, multiplicam-se as mortes. No final, a inevitável derrota dos trabalhadores.
]Mas, na visão do otimista Zola, era uma derrota que não deixava os vitoriosos tranquilos, pois os mineiros haviam descoberto sua própria força.
A imagem quente, cheia de luz, que fecha a epopeia de Étienne é a mais bela visão desse otimismo.
Afastando-se da mina, rumo a Paris, Étienne observa as sementes germinando no campo, a vida vegetal encorpando e transbordando.
Para ele, os mineiros não demorariam a fazer o mesmo. Em breve, um exército negro brotaria da terra, a golpes de picareta, para conquistar o mundo.
"Germinal" e de modo geral toda a obra de Zola costumam ser tachados de maniqueístas. Mas a segunda metade do século 19 europeu não foi uma época muito matizada. Nesse contexto, parecia haver apenas o bem e o mal.
Isso permitiu a Zola, em seu romance mais persuasivo sobre a luta de classes, dizer de maneira clara e direta, sem rodeios: abençoados proletários do mundo, arranquem da burguesia demoníaca o que é seu de direito.
LUIZ BRAS é autor de "Sozinho no Deserto Extremo" (Prumo).
GERMINAL
AUTOR Émile Zola
EDITORA Estação Liberdade
TRADUÇÃO Mauro Pinheiro
QUANTO R$ 79 (560 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo
Livraria da Folha
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