Crítica
História e fatos alternativos se confrontam em 'Negação'
O assunto está na ordem do dia. "Negação", que reconstrói um embate jurídico ocorrido em 1996 sobre o Holocausto, debate temas da agenda dos nossos tempos: as "verdades alternativas", a intolerância religiosa e a supremacia das crenças sobre fatos históricos.
O filme trata de um embate real que teve lugar na Inglaterra e que opôs o britânico David Irving (Timothy Spall), negador do Holocausto, e a historiadora norte-americana Deborah Lipstadt (Rachel Weisz).
Divulgação | ||
Rachel Weisz como a historiadora americana Deborah Lipstadt em 'Negação' |
Após ser atacado pela acadêmica em um livro, Irving inicia uma cruzada contra ela, constrangendo-a em locais públicos e insistindo em sua tese de que o Holocausto não teria ocorrido porque não existem evidências suficientes para prová-lo.
Lipstadt, de início, se recusa a debater com Irving por considerar que não se deva dar espaço a negacionistas. "Não discuto com gente que pensa que Elvis não morreu", arremete, ironicamente.
Mas a situação se complica quando Irving inicia um processo por difamação contra ela no Reino Unido, onde, diferentemente do que ocorre nos EUA, é a parte que teoricamente ofende a que tem de provar que está correta.
Lipstadt acha que esse aspecto jurídico, aplicado ao Holocausto, é inaceitável, mas se resigna à estratégia de um talentoso grupo de advogados locais que aceita a tarefa de buscar as provas de que o Holocausto ocorreu, além de encontrar falhas nas especulações de Irving.
O caso teve ampla repercussão à época e, apesar de o desenlace favorável a Lipstadt, a historiadora considerou que o fato de ter de decidir a questão num tribunal já era algo difícil de engolir. Em especial porque Irving conseguiu público para suas falácias, foi saudado por outros negacionistas e atraiu grande atenção midiática.
Lipstadt voltou ao foco recentemente quando escreveu um artigo dizendo que a presença de Donald Trump na Casa Branca dava força aos negacionistas, apontando para os que compõem a cúpula do governo. E fez uma distinção, dizendo que há o negacionismo leve e o pesado, mas que ambos, porém, são fatais.
"Negacionismo pesado é o tipo de coisa com que me enfrentei no tribunal, com David Irving, em que este negava os fatos em si. Já o negacionismo leve usa uma tática diferente, mas que atinge o mesmo objetivo, o de minimizar os acontecimentos e relativizar os números", disse, indicando que é este "leve" que impera na Casa Branca hoje.
"Negação" está longe de ser um "filme de tribunal" clássico, apesar de ocorrer majoritariamente numa corte. É muito mais um filme político que traz elementos para o debate contemporâneo sobre o que vem ocorrendo no mundo desde a eleição de Donald Trump.
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