Suu Kyi é símbolo da luta contra repressão em Mianmar
Mesmo tendo passado 14 dos últimos 20 anos presa, a líder da oposição pró-democracia em Mianmar (antiga Birmânia) e Nobel da Paz Aung San Suu Kyi, 64, permanece como o símbolo da repressão sobre o povo daquele país, que enfrenta uma ditadura militar desde 1962 e hoje é considerado um dos países mais pobres e isolados do planeta.
Nesta terça-feira, ela foi condenada a mais 18 meses de prisão domiciliar por ter violado os termos da prisão domiciliar que cumpria desde 2003 ao receber, em sua casa, o americano John Yettaw. Com a condenação, Suu Kyi fica impedida de participar nas eleições nacionais convocadas que a Junta Militar promete realizar em 2010.
Suu Kyi é a a figura mais visível da oposição ao regime militar que governa Mianmar desde 1991, quando recebeu o Nobel da Paz pela sua luta pacífica em prol da democracia e dos direitos humanos.
Nesse período, a causa birmanesa ganhou certa repercussão internacional graças ao rosto de Suu Kyi, gravado nas camisetas dos jovens do Ocidente junto a frases como "usem sua liberdade para promover a nossa" e aos pedidos de liberdade feitos por celebridades como Bono, líder da banda U2.
No entanto, poucas dessas chamadas chegaram a Suu Kyi, que viveu os últimos anos sem telefone e internet e com visitas controladas, inclusive a de seus dois filhos, que moram no Reino Unido e a quem não vê há quase uma década.
Dai Kurokawa/Efe | ||
Grupo favorável à democracia em Mianmar realiza protesto contra a condenação de Suu Kyi em Tóquio (Japão) |
Trajetória
Nascida em 19 de junho de 1945, abandonou seu país aos 15 anos com destino à Índia, onde a mãe, Khin Kyi, ocupava o cargo de embaixadora. Três anos depois, morreu assassinado em Yangun o general Aung San, seu pai e herói da independência birmanesa.
Em 1964, Suu Kyi se mudou para a cidade britânica de Oxford para cursar filosofia, economia e política. Ali conheceu aquele viraria o seu marido, Michael Aris, com quem teve os seus dois filhos, Alexander e Kim. Após um período de trabalho e estudos no Japão e no Butão, Suu Kyi retornou a Mianmar em 1988 para cuidar da mãe.
Mas a revolta popular que o país vivia então não a deixou indiferente e, em seguida, ela se colocou à frente do movimento a favor da democracia, demonstrando que seu carisma lhe dava um grande poder de mobilização de massas. O regime reagiu com força aos grandes protestos, assassinando mais de 3.000 manifestantes nas ruas de Yangun.
Mas os militares não conseguiram conter o ímpeto popular, e, em 1990, foram obrigados a convocar eleições gerais. O partido liderado por Suu Kyi, a Liga Nacional pela Democracia (LND), ganhou por grande maioria o pleito, cujos resultados nunca foram aceitos pela Junta Militar. Naquela época, Suu Kyi já cumpria sua primeira prisão domiciliar e já tinha feito sua primeira greve de fome.
Sua primeira etapa de reclusão terminou seis anos depois, mas a tragédia minou a felicidade com a notícia da morte do marido, vítima de um câncer, em Londres. Em 1999, os generais haviam negado o visto de entrada ao marido de Suu Kyi, que resistiu a sair de Mianmar por temor de que as autoridades impedissem seu retorno.
A prisão domiciliar voltou a ser imposta à Nobel da Paz em setembro de 2000, quando ela desafiou o regime e tentou viajar de trem para o norte do país.
Durante o segundo período de confinamento, a Junta Militar permitiu que Suu Kyi se reunisse algumas vezes com membros de seu partido e com diplomatas, como o então representante especial das Nações Unidas para Mianmar, Razali Ismail. O governo mudou de estratégia em outubro de 2000 e iniciou conversas com Suu Kyi.
Porém, voltou a privá-la de liberdade em 30 de maio de 2003, após um sangrento confronto entre partidários do regime e membros da LND, que terminou com a morte de pelo menos 70 pessoas. Quando se aproximava o fim dessa sentença, a Nobel da Paz foi novamente presa no centro de segurança máxima de Insein, onde acaba de ser condenada novamente.
Com a decisão, a Junta demonstra a solidão do regime e a pouca flexibilidade às pressões da comunidade internacional, que pediu, em diversas ocasiões, a libertação de Suu Kyi e a dos demais 2.000 presos políticos.
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