Chegada de senador boliviano abre crise no Itamaraty
Apesar da participação de um diplomata e de dois fuzileiros navais brasileiros, o Itamaraty informou que abriu inquérito interno para investigar a entrada no Brasil anteontem do senador boliviano Roger Pinto Molina, que é opositor do governo Evo Morales e estava refugiado havia quase 15 meses na embaixada brasileira em La Paz.
Ele não podia sair do prédio por falta de um salvo conduto do governo boliviano.
A versão do Planalto e do Itamaraty é de que o governo não autorizou e nem sequer sabia da operação para retirar Molina do país vizinho.
Por isso, o Ministério das Relações Exteriores soltou nota para informar que irá "tomar as medidas administrativas e disciplinares cabíveis" contra os responsáveis.
O encarregado de negócios em La Paz (espécie de embaixador interino), Eduardo Saboia, tido como o principal articulador da ação, foi convocado por telefone e é esperado hoje em Brasília para prestar esclarecimentos.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
Diplomata experiente, ele foi o responsável, por exemplo, pela negociação que libertou 12 corintianos presos após a morte de um torcedor boliviano em fevereiro.
Em entrevista ao "Fantástico", da TV Globo, ele afirmou que houve um pedido do Itamaraty para que ele não desse entrevistas sobre o assunto, mas que resolveu falar porque o seu nome foi citado na nota do órgão.
"Tomei a decisão de conduzir essa operação pois havia risco iminente à vida e à dignidade de uma pessoa."
Saboia afirmou que por duas vezes esteve em Brasília relatando que a situação era "ruim" --inclusive pedindo para deixar o posto.
Segundo o diplomata, havia uma violação constante de direitos humanos porque não havia uma negociação em curso para a saída do senador da embaixada.
Saboia viajou em um carro diplomático junto com Molina até a fronteira.
O advogado brasileiro de Molina, Fernando Tibúrcio, afirmou que o Itamaraty foi avisado, durante a semana, da possibilidade de que uma medida fosse tomada para resolver a questão do asilado.
CRIMINOSO
Na sua primeira manifestação, o governo da Bolívia disse considerar que o senador fugiu de seu país como um "criminoso", além de esperar explicação do Brasil.
Molina é acusado por Morales de assassinato, desacato e dano ambiental. Ele nega as acusações.
Apesar disso, a ministra de Comunicação do país, Amanda Dávila, garantiu que as relações bilaterais se mantêm em situação de "absoluta cordialidade e respeito".
O chanceler Antonio Patriota adiou viagem que faria à Finlândia e, conforme a Folha apurou, telefonou para o colega boliviano, David Choquehuanca, informando que o Itamaraty não autorizou nem tomou conhecimento antecipado da operação.
A presidente Dilma Rousseff também não teria sido informada previamente e teria reagido com irritação.
A situação é classificada como "delicadíssima" no governo, mas não há intenção de extraditar Molina a La Paz, por "questão humanitária", já que ele estaria doente.
Durante o deslocamento de La Paz até o Brasil, o grupo foi interceptado pelo menos três vezes pela polícia da Bolívia ao longo do percurso de 1.600 km.
Mas o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, também envolvido na operação, diz que Molina conseguiu seguir viagem em razão da imunidade do veículo e da presença do diplomata brasileiro.
Ao chegar a Corumbá (MS), Molina embarcou para Brasília em um avião particular cedido por um empresário capixaba, amigo de Ferraço.
Ele disse que optou pela aeronave para não colocar novamente em risco a vida do boliviano, já que a região de fronteira é alvo de narcotraficantes. O parlamentar boliviano recebeu asilo do Brasil em junho do ano passado.
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