Para analistas, motivação de Assad em ataque químico é enigma
Sana | ||
O ditador sírio, Bashar al-Assad, durante entrevista ao jornal croata "Vecernji List" em Damasco |
Por que o ditador sírio, Bashar al-Assad, atacaria civis com armas químicas justamente no momento em que está "ganhando" a guerra civil que assola a Síria desde 2011, sabendo que essa atrocidade faria a comunidade internacional pedir sua cabeça? Essa é a pergunta que vem desafiando vários analistas e originou uma série de teorias conspiratórias na internet.
Desde setembro de 2015, quando a Rússia passou a apoiar Assad com ataques aéreos e tropas terrestres, o regime começou a recuperar territórios e virar o jogo. Em dezembro do ano passado, Assad retomou dos rebeldes a segunda maior cidade do país, Aleppo.
O governo Trump vinha dando indicações de que derrubar Assad não era prioridade e que ia se concentrar no combate ao Estado Islâmico. A embaixadora dos EUA na ONU, Nikki Haley, disse em março: "nossa prioridade não é mais tirar o Assad
"A história mostra que líderes atacam suas populações quando estão desesperados ou prestes a serem depostos", afirma o especialista em terrorismo Max Abrahms, professor da Northeastern University. "É um pouco estranho pensar que Assad resolveu comemorar seus ganhos territoriais atacando a população com armas químicas."
Segundo autoridades sírias e russas, o que houve foi um bombardeio acidental de um depósito onde a oposição armazenava as armas químicas.
Mas essa versão é vista como pouco provável pela maioria dos especialistas. Serviços de inteligência das EUA e da França afirmam ter evidências de que realmente foi o Exército sírio que atacou a cidade de Khan Sheikhoun e matou ao menos 72 pessoas.
Para o presidente do Council on Foreign Relations, Richard Haass, o ataque é "um mistério". "Talvez Assad não esteja tão confiante sobre sua posição quanto as pessoas acham e possivelmente queira não incentivar os que se opõem ao regime e controlar territórios liberados do EI".
Uma terceira hipótese, remota, seria uma ação não autorizada do Exército sírio. Para Abrahms, os generais podem ter decidido fazer o ataque, à revelia ou sem ter luz verde de Assad. Já a mudança de posicionamento do presidente Donald Trump é mais fácil de entender, embora tenha sido bastante brusca.
Em 2013, Trump tuitou várias vezes censurando as intenções do ex-presidente Obama de intervir na Síria. "A Síria não é problema nosso" e "Não ataque a Síria". Quando as imagens chocantes do ataque em Khan Sheikhoun vieram à tona, Trump inverteu sua posição e passou a condenar a inação de seu antecessor. Na noite desta quinta (6), atacou a Síria.
IMAGEM
Em 2012, o presidente Obama advertiu Assad de que o uso de armas químicas seria "uma linha vermelha". Em 2013, Assad matou 1.300 pessoas com um ataque de gás sarin em Ghouta. Mesmo assim, Obama acabou não intervindo no país.
Antes de realizar o ataque de mais de 50 mísseis nesta quinta, Trump disse que "algo precisa acontecer" com Assad. E o secretário de Estado Rex Tillerson sugeriu a possibilidade de "mudança de regime". "Trump quer ser visto como um cara durão, então podemos esperar algum tipo de ação militar", disse Abrahms à Folha horas antes do ataque.
O tamanho dessa ação é que era dúvida até então. Analistas avaliam que um ataque às forças de Assad pode ser mais uma resposta simbólica. Assim, Trump não será visto como alguém que recua e se diferencia de Obama.
De quebra, ganha pontos internamente. No momento em que o governo Trump é alvo de várias investigações sobre a interferência russa nas eleições, o republicano bombardeia o protegido de Putin, uma boa maneira de estabelecer sua "independência" do Kremlin.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
Livraria da Folha
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade
- 'Fluxos em Cadeia' analisa funcionamento e cotidiano do sistema penitenciário
- Livro analisa comunicações políticas entre Portugal, Brasil e Angola
- Livro traz mais de cem receitas de saladas que promovem saciedade
Um mundo de muros
Em uma série de reportagens, a Folha vai a quatro continentes mostrar o que está por trás das barreiras que bloqueiam aqueles que consideram indesejáveis