Para pesquisador, caso Collor mostra que Brasil não é um país sério
A frase "Le Brésil n'est pas un pays serieux" ("O Brasil não é um país sério") costuma ser atribuída a Charles de Gaulle. Não obstante ter reais motivos para dizê-lo, ele nunca disse que o Brasil não é um país sério. O autor da frase é o diplomata brasileiro Carlos Alves de Souza Filho, embaixador do Brasil na França entre 1956 e 1964.
Mas, na alvorada de uma decisão do STF num processo que tramitou 23 anos para ser julgado, depois de ter passado por diversas instâncias, podemos dizer outra coisa sobre o Brasil?
Em tempos de Copa do Mundo e campanha de Dilma sobre "orgulho de ser brasileiro", devemos fechar os olhos e tapar os ouvidos, sermos o já tão comentado brasileiro cordial e ignorar a importância do império da lei no país.
O verdadeiro Estado Democrático de Direito assegura direitos políticos, liberdades civis e mecanismos de controle e prestação de contas, sempre visando proporcionar igualdade política para todos os cidadãos bem como impedir potenciais abusos de Estado.
Beto Barata -31.mar.2014/Folhapress | ||
Após tramitar por 23 anos, processo contra o ex-presidente Fernando Collor foi julgado improcedente pelo STF |
Neste sentido, o império da lei pressupõe um cidadão minimamente educado e capaz de compreender o universo jurídico que deve respeitar, além disso, entender que o rol de direitos estabelecidos nas leis devem ser exercidos por meios institucionais.
A conjuntura brasileira não permite outra conclusão, senão a da frase em epígrafe. Casos como Amarildo, o assassinato do dançarino da TV Globo, prisão de um ator negro no Rio de Janeiro, assim como a impunidade revestida de proteção aos direitos de réus que possuem recursos econômicos e políticos para que isto ocorra, nos dá a certeza que a democracia brasileira precisa de maiores cuidados.
A atuação do Judiciário brasileiro é questionada, haja vista que os recursos protelatórios e os vários graus de jurisdição têm proporcionado aos advogados de defesa explorarem ao máximo as oportunidades de retardamento das condenações, quando não sua inviabilização, como ocorreu ontem à tarde no STF.
Podemos, sem receio de incorrer em eventual equívoco, dizer que o funcionamento do Estado de Direito está diretamente ligado com as demais dimensões da qualidade da democracia –igualdade, por exemplo– e que o império da lei, não é um fim em si mesmo, devido a sua concretude pressupor ganhos mútuos de diversas naturezas.
Neste sentido, se houver uma postura de enrijecimento penal para punir de maneira rigorosa eventuais abusos trazendo ganhos para a legitimidade dos agentes de Estado, por outro lado tal enrijecimento pode, frise-se, trazer perdas para as garantias de liberdade do cidadão como presunção de inocência, privacidade e intimidade, dentre outras.
A ideia não é de Estado Policial, porém resta claro que, em tempos de globalização e Copa de Mundo, "Brazil is not a serious country".
JOÃO PEDRO PARO é advogado, cientista social e pesquisador do Núcleo de Pesquisas em Políticas Públicas da USP.
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