Ex-comunista que se aliou a oposição contra Lula, Roberto Freire muda mais uma vez
Na semana passada, quando assumiu a presidência da recém-criada Mobilização Democrática, o deputado federal Roberto Freire (SP) repetiu uma proeza que já realizara duas outras vezes nos últimos 23 anos: trocou de partido sem sair de onde estava.
A façanha levou o homem que comandou o antigo Partido Comunista Brasileiro e depois se aliou aos liberais do DEM em duas eleições presidenciais a promover agora uma fusão com o inexpressivo PMN. Tudo em nome da "esquerda democrática".
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Freire entrou no velho Partidão, como o PCB era conhecido pelos militantes, em 1962, quando a organização agia na clandestinidade. Estudante de direito, dava sua contribuição à agenda política em Pernambuco advogando para trabalhadores rurais.
A situação ficou mais complicada após o golpe militar de 1964. Com o Ato Institucional número 5 e o endurecimento do regime em 1968, colegas foram presos e Freire mudou-se para o Chile.
Casou-se lá. Sua primeira mulher era filha de um funcionário da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina), mesma organização na qual o ex-governador paulista José Serra trabalhou quando exilado na ditadura.
"Foi a festa dos exilados. O Serra esteve lá. Na época, só o conhecia de longe", lembra.
Pedro Ladeira/Folhapress | ||
Reunião de fusão do PPS com o PMN para lançar a MD; Roberto Freire (ao microfone) é o presidente da nova sigla |
De volta ao Brasil, Freire entrou no MDB. Vários nomes do PCB fizeram o mesmo. Migraram com a esperança de operar de dentro da sigla a legalização do Partidão.
A legitimação só veio no governo de José Sarney, em 1985. "Nisso ele foi um democrata. Quando sondamos Tancredo, ele pediu para esperarmos a Constituinte. Sarney fez antes", afirma Freire.
Ele disputou a Presidência em 1989 e terminou em nono lugar. Começou a promover a primeira mudança no PCB um ano depois, quando derrotou o arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2013) numa disputa pelo comando da sigla.
Na ocasião, Niemeyer sustentou a mesma posição que manteve até o fim da vida --morreu aos 104 anos defendendo o stalinismo. Freire achava que o partido deveria se modernizar. Ele saiu vitorioso e, dois anos depois, transformou o PCB no PPS.
Após o impeachment de Fernando Collor, tornou-se líder do governo Itamar Franco, uma administração de "centro-esquerda", avalia. "Na época, defendi que o PT integrasse o governo. Se tivessem aceitado, Lula teria sido candidato em 1994 com o apoio de Itamar e do PSDB. Era preciso que José Dirceu desistisse de disputar o governo de São Paulo para apoiar Mário Covas, mas o PT sempre foi isolacionista."
Após executar o Plano Real, o nome de Fernando Henrique Cardoso, então ministro da Fazenda, emplacou. Freire ficou com o PT, pela "identidade de esquerda", e fez campanha para Lula em 1994. Em 1998 e 2002, lançou Ciro Gomes candidato, mas apoiou Lula no segundo turno.
Lula eleito, em 2004 o PPS rompeu com o PT. "Saímos antes do mensalão. Discordamos da política econômica. Bolsa Família não é de esquerda. Política compensatória é um mecanismo neoliberal." Tornou-se crítico implacável do "lulopetismo".
Contra Lula, em 2006, o PPS subiu no palanque ao lado do PFL, hoje DEM, para apoiar o governador Geraldo Alckmin (PSDB) ao Planalto.
Em 2010, a cena se repetiu, mas em nome das pretensões de José Serra. Freire o trata como amigo, embora em 2002, quando o tucano se candidatou pela primeira vez, tenha ficado com Lula --"não faço política por amizade".
Hoje, os dois estão em contato constante por conta da terceira mutação que Freire promove em seu partido: a fusão com o PMN, cujo produto é a Mobilização Democrática.
O PMN tem três deputados federais, entre eles a filha do ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz, Jaqueline, flagrada recebendo R$ 50 mil quando o chamado mensalão do DEM foi descoberto.
"Não circunscreva um processo tão amplo a esse aspecto. Se for para falar, o que dizer do PT, que tem condenados? É impossível fazer o que estamos fazendo sem passar por esse tipo de situação", diz.
Freire trata a fusão como parte importante de um processo de "reorganização das oposições". A nova sigla deve servir ao governador Eduardo Campos (PSB-PE), que se descola do governo Dilma Rousseff (PT) para despontar como opção em 2014.
Freire não esconde a predileção por Campos, mas diz que a MD é para todos: convidou Serra e oferece a sigla como plano B para a ex-senadora Marina Silva, caso não consiga tirar a Rede do papel.
Mas o futuro da MD como "nova oposição" não está garantido. O governo opera para limitar seu tempo de TV e recursos partidários. Freire chama o movimento de "golpe" e diz que brigará na Justiça.
"Dilma não vai decidir contra quem deseja concorrer em 2014 com sua maioria no Congresso. Há uma nova oposição surgindo e não vai parar."
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