Sob pressão, Temer recua e revoga decreto de Forças Armadas
Pedro Ladeira/Folhapress | ||
Homens do Exército na Esplanada dos Ministérios na manhã desta quinta (25), um dia após protesto |
Sob pressão da base aliada, o presidente Michel Temer recuou e revogou decreto para atuação das Forças Armadas no Distrito Federal.
A revogação saiu em edição extra do "Diário Oficial da União" nesta quinta-feira (25). Em meio a episódios de violência e depredação, o peemedebista havia publicado na quarta-feira (24) o decreto que permitia aos efetivos militares atuarem com poder de polícia até a próxima quarta-feira (31), o que criou uma crise com a Câmara dos Deputados. A função principal, segundo o ministro da Defesa, Raul Jungmann, seria a proteção de prédios da Esplanada, embora militares tenham sido vistos circulando por outras áreas de Brasília.
"O presidente, considerando que foi restaurada a ordem, a tranquilidade e o respeito à vida, decretou a suspensão da Garantia da Lei e da Ordem", disse Jungmann. "A orientação dada ao general que comandou a operação foi de que as Forças Armadas funcionassem defensivamente. Isso quer dizer duas coisas: que protegesse o patrimônio e a vida das pessoas. E que em nenhum momento se envolvesse com a repressão ou com uma questão diretamente atendida pela força policial do governo do Distrito Federal".
Antes de tomar a decisão, o presidente foi alertado por auxiliares e assessores do desgaste que a presença das Forças Armada poderia causar à sua imagem, já prejudicada pelas delações da JBS.
Ele, no entanto, decidiu seguir adiante por entender que a escalada da violência geraria um dano ainda maior. Na própria quarta-feira (24), o peemedebista disse que poderia revogar o decreto se a situação voltasse ao normal.
"A manifestação democrática é protegida pelo Estado. Agora, o vandalismo, a barbárie, colocar em risco a vida das pessoas e destruir o patrimônio que pertence ao povo brasileiro não serão tolerados. A desordem não será tolerada. E será combatida dentro da lei e da ordem de acordo com os mandamentos da Constituição Federal", afirmou o ministro.
Pelo decreto, publicado em edição extra do "Diário Oficial da União", as Forças Armadas atuariam pela GLO (Garantia da Lei e da Ordem). O dispositivo autorizava os militares a atuarem com poder de polícia quando há o esgotamento das forças de segurança pública ou no caso de situações de perturbação.
Eduardo Anizelli/Folhapress | ||
Ministro Chefe da Casa Civil Eliseu Padilha com presidente durante reunião no Palácio do Planalto |
"O presidente decretou, repito, por solicitação do presidente da Câmara dos Deputados, uma ação de Garantia da Lei e da Ordem", disse o ministro da Defesa, Raul Jungmann.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), no entanto, negou que tenha pedido o emprego das Forças Armadas. Segundo ele, solicitou que a Força Nacional garantisse a segurança nas adjacências do Congresso Nacional e pediu uma retratação do ministro da Defesa.
Em reação, o governo peemedebista confirmou que Maia pediu o emprego da Força Nacional. Segundo ele, contudo, o efetivo disponível em Brasília já havia sido utilizado para proteger o entorno do Palácio do Planalto.
Manifestantes e policiais militares entram em conflito na Esplanada dos Ministérios |
Por isso, e devido ao tamanho da manifestação, o GSI (Gabinete de Segurança Institucional) e o Ministério da Defesa decidiram que as Forças Armadas seriam mais efetivas.
Criada em 2004, a Força Nacional atua na preservação da ordem pública, na incolumidade das pessoas e do patrimônio e em situações de calamidades públicas. Ela é formada por policiais militares e civis e por integrantes na reserva das Forças Armadas.
O protesto foi organizado por centrais sindicais e movimentos de esquerda pela saída do presidente, contra as reformas da previdenciária e trabalhista e a favor da convocação de eleições diretas.
Nos bastidores, auxiliares e assessores presidenciais reconhecem que o protesto reuniu público maior do que era esperado. Segundo a Polícia Militar, 25 mil pessoas participaram da manifestação.
A preocupação é de que, a partir de agora, o clima de animosidade popular contra o governo peemedebista se intensifique e novas manifestações com episódios de violência ocorram em todo o país.
CRÍTICAS
A necessidade de uso da GLO no contexto das manifestações desta quarta (24) divide especialistas ouvidos pela Folha.
Para o presidente da Comissão de Direito Constitucional da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo), o advogado Roberto Dias, não ficou evidente o esgotamento das forças pela Polícia Militar do Distrito Federal. Por isso, ele avalia a medida como ilegal.
"Não me pareceu que a polícia não pudesse fazer a contenção dos manifestantes e dos atos de violência. Em razão disso, acredito que houve precipitação do governo, considerando que o decreto de Garantia da Lei e da Ordem é para casos excepcionais, quando da reconhecida falência das forças policiais numa situação", disse.
Já o também advogado constitucionalista Adib Abdouni, ex-professor universitário, afirma que o presidente da República tem autonomia para decretar o emprego da GLO, seja para prevenção ou contenção de atos violentos. "Acredito que não foi abuso. Foi uma ação de prevenção em razão da quantidade de pessoas e na necessidade de reforço para conter a agressividade dos manifestantes", diz.
A convocação das Forças Armadas para a Garantia da Lei e da Ordem está prevista na Constituição (artigo 142), em leis complementares (lei 97/1999) e em decretos (3.897/2001).
A decisão é exclusiva do presidente da República, de forma a atender pedidos dos poderes constitucionais, como Estados, Justiça e Câmara dos Deputados.
Não foi a primeira vez que o governo federal decretou a medida. Durante a gestão da ex-presidente Dilma Rousseff, as Forças Armadas foram convocadas para grandes eventos, como Copa do Mundo e Copa das Confederações, e também para leilões de campos de petróleo do pré-sal.
Em 2013, Dilma convocou o Exército para proteger o Palácio do Planalto e outros prédios públicos em meio à onda de de manifestações que tomou o país. Mas a medida na época não foi feita pela GLO.
DECRETO JÁ FOI ACIONADO ANTES
A crise nos presídios e a greve da Polícia Militar no Espírito Santo, no começo deste ano, foram dois dos motivos que fizeram o presidente Michel Temer acionar a Garantia da Lei e da Ordem, decreto que dá às Forças Armadas o poder temporário de polícia.
O Exército foi chamado via GLO oito vezes desde que Temer assumiu, para Olimpíadas, eleições e outras crises de segurança nos Estados, a pedido de governadores. Desde 2010, foram 29 convocações, diz o ministério da Defesa.
Nesta quarta (24), Temer usou a GLO em um protesto contra seu governo, em Brasília, depois do acirramento do conflito entre manifestantes e a polícia.
O governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB), não foi comunicado de que Temer considerava as forças policiais locais "indisponíveis, inexistentes, ou insuficientes", como recomenda a legislação.
Essa foi a segunda vez que um presidente acionou a GLO para conter protestos. Dilma fez isso em 2013 para reforçar a segurança no Rio durante o primeiro leilão do pré-sal. Para que o Exército fosse às ruas, o Estado declarou que a Polícia estava exausta.
Antes, em 20 de junho, Dilma convocou o exército após protesto em Brasília, mas sem recorrer à GLO. Os soldados foram designados para reforçar a segurança nos palácios do Planalto, Alvorada e Jaburu, além da Granja do Torto.
Colaborou VENCESLAU BORLINA FILHO
Livraria da Folha
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