Sem padres, igreja repensa celibato no Amazonas
Danilo Verpa/Folhapress | ||
Dom Adolfo Zon Pereira, maior autoridade católica da região, em missa em Tabatinga (AM) |
Em meio a discussões sobre a possibilidade de tornar opcional o celibato para padres em comunidades remotas da Amazônia, sacerdotes, missionários e religiosos da região divergem sobre a medida.
Para dom Adolfo Zon Pereira, 61, bispo da diocese do Alto Solimões, que abrange sete municípios na área que concentra a maior parte dos índios e comunidades ribeirinhas isoladas do Estado do Amazonas, o fim da obrigatoriedade do celibato não resolveria o problema da falta de padres na região.
Ele reconhece, porém, a dificuldade que a Igreja Católica encontra para atender aos povos da Amazônia com a estrutura existente hoje. Os principais padres e religiosos estão chegando a idades avançadas sem que haja quem os substitua. O crescimento das cidades, diz ele, não é acompanhado pelo aumento de religiosos presentes.
A microrregião do Alto Solimões engloba dez municípios que ocupam área de 213 mil quilômetros quadrados. O rio Solimões é a principal via de acesso entre as cidades. Para ir de Tabatinga, na tríplice fronteira de Brasil, Colômbia e Peru, para Jutaí, por exemplo, onde há grande concentração de terras indígenas, leva-se até dez dias de barco.
LOGÍSTICA
A dificuldade logística e o isolamento das áreas são hoje os principais entraves ao crescimento da Igreja Católica na Amazônia, que registra, segundo o Censo do IBGE, perda de fiéis para as igrejas evangélicas.
Em 2010, o Amazonas tinha 31% de evangélicos –alta de 10 pontos percentuais em relação a 2000. No mesmo período, o número de católicos caiu a 59,5% da população –eram 70,8% em 2010.
A perda de fiéis levou o papa Francisco a considerar a opção de ordenar homens casados como sacerdotes da igreja. A discussão será posta na mesa no Sínodo Pan-Amazônico, encontro de bispos da região em 2019.
Natural da Espanha, dom Adolfo chegou a Tabatinga em 1994, quando o município, a 1.100 km de Manaus, tinha cerca de 30 mil habitantes. Hoje, com 67 mil pessoas, é conhecido como uma das principais paradas das rotas do tráfico de drogas da Colômbia e Peru para o Brasil. É também importante ponto de transporte para regiões remotas da Amazônia.
Segundo o bispo, o celibato opcional não teria impacto significativo na quantidade de padres. Ele admite que ainda está estudando o tema, mas acredita que o celibato confere ao religioso um senso de vocação maior junto à igreja e seus fiéis.
"Não acho que seja uma questão de celibato sim ou celibato não na Amazônia. Hoje temos um problema vocacional, e o celibato nos ajuda a fazer um trabalho pastoral voltado unicamente para o povo", diz ele, que recebe dois salários mínimos pelo trabalho na diocese.
IGREJA CATÓLICA
Atualmente, a Igreja Católica tem 40 pessoas, das quais 18 padres, no Alto Solimões. Onze diáconos se formarão neste ano em São Paulo de Olivença, a 980 km de Manaus. Os diáconos permanentes são clérigos com permissão para serem casados, terem filhos e uma profissão fora da igreja. Podem fazer batizados, celebrar casamentos e também a palavra de Deus, mas não podem, por exemplo, consagrar a hóstia, ouvir confissões e dar a chamada extrema-unção.
Também de Tabatinga, o padre Waldemir Geisler concorda com o bispo sobre o celibato. "Acho que não daria conta de cuidar da igreja e de uma esposa e família ao mesmo tempo. A igreja demanda dedicação integral", diz ele.
Tabatinga é exemplo da competição por fiéis na região Amazônica. Há três igrejas católicas na cidade, e cerca de 20 evangélicas. Na avenida da Amizade, a principal da cidade, que leva à Colômbia, há ao menos quatro igrejas evangélicas, entre elas um grande prédio da Universal do Reino de Deus e outro da Assembleia de Deus, esta que completou cem anos na cidade.
Os evangélicos têm presença forte entre indígenas e ribeirinhos. A crítica é que geralmente a evangelização de índios é acompanhada de pressão para que deixem sua cultura tradicional, como pintura corporal e língua nativa.
"A principal queixa das comunidades isoladas é que a presença da Igreja Católica não é constante", afirma o missionário Francisco Loebens, 59, do Cimi (Conselho Indigenista Missionário). "A mudança poderia criar uma condição mais favorável à presença maior nesses locais". A opinião é compartilhada por um seminarista de Manaus ouvido pela Folha na condição de anonimato.
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