Decoração de Natal na Paulista vira dor de cabeça para CET
Skatistas, estátuas vivas, patinadores, cinéfilos, ciclistas, músicos, baladeiros, visitantes de exposições. Os 2,8 km da Paulista são um corredor de lazer para paulistanos com todos os gostos e bolsos. Nas próximas semanas, mais um grupo, a cada ano maior, literalmente invadirá a via: os amantes de decorações de Natal.
Desde 2010, a principal atração sazonal é a Praça de Natal, palco de 800 m² montado pela prefeitura entre as ruas Padre João Manuel e Ministro Rocha Azevedo. Na edição passada, só essa passarela -com bonecos gigantes, música típica e monitores- recebeu cerca de 480 mil visitantes, entre os dias 4 e 25 de dezembro.
Papai Noel vai chegar, agora só falta a prefeitura
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O público é maior porque não fica restrito a esse trecho. Do Paraíso à Consolação, bancos e centros comerciais capricham nos papais noéis. Assim, a decoração generalizada, o clima quente e os dias de folga são um convite para o paulistano tirar a família de casa e passear sem gastar nada.
No ano passado, a quantidade de gente na Paulista foi tão grande que a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) foi obrigada a interditar, nas noites de 17, 18 e 21 de dezembro, a circulação de veículos. Foi a primeira vez, durante o Natal, que os pedestres ocuparam todas as oito faixas.
Além disso, neste ano há a ciclofaixa de lazer, que ocupa duas faixas aos domingos e feriados, entre 7h e 16h. Inaugurada em setembro, a rota é um sucesso. No domingo passado, o sol forte atraiu 50 mil pessoas nos 40,9 km que ligam a Paulista, o centro e o parque das Bicicletas, na zona sul. O cálculo é da M&C Saatchi F&Q, responsável pela gestão das ciclofaixas.
Diante desse cenário, era de se esperar que a CET, que estreou em outubro operações em áreas como a 25 de Março, estivesse com seu planejamento para o fim de ano na Paulista a todo vapor. Mas até a conclusão desta edição nada tinha sido divulgado.
Apesar de a Praça de Natal não ter data para ser inaugurada, ela está confirmada pela SPTuris, empresa de turismo da cidade que cuida do evento. A própria CET anunciou interdições na via até o dia 28 para a montagem.
Em nota, a companhia afirma que a interdição do tráfego de veículos no ano passado não serve como base para ações futuras. A CET declarou que "não trabalha com hipóteses" para planejar o trânsito paulistano.
A aparente falta de organização incomoda moradores e motoristas. E a interdição para carros divide público, especialistas e autoridades. As atrações natalinas viraram um grande evento na Paulista, mas ninguém parece saber direito o que fazer com isso.
BLOQUEIA OU NÃO BLOQUEIA?
Segundo o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado em 2007 por prefeitura e Ministério Público Estadual, a Paulista só pode ser interditada para carros em três ocasiões: Parada Gay, São Silvestre e Réveillon. O objetivo é minimizar impactos em colégios, hospitais, empresas e prédios residenciais da região.
Acostumados com esses tradicionais eventos, os motoristas foram pegos de surpresa com o bloqueio natalino. A "medida emergencial", segundo a CET, foi para evitar atropelamentos. A Promotoria não gostou. O órgão enviou à CET uma notificação extrajudicial contestando a interdição. O documento previa multa diária de R$ 30 mil, mas a notificação foi arquivada.
Para evitar que o TAC seja desrespeitado de novo, o Ministério Público disse, em nota, que chamará CET e Banco do Brasil, patrocinador da Praça de Natal nos anos anteriores, para saber quais providências serão tomadas para garantir a circulação na Paulista e a segurança de pedestres. A audiência ainda não tem data definida.
"Em 2011, o trânsito na Paulista parou. Não é uma hipótese. As medidas para o período já devem estar sendo discutidas há um bom tempo", acredita Luiz Célio Bottura, ex-ombudsman da CET. "Nada será definido na hora."
O sigilo sobre eventuais bloqueios pode ser justificado, segundo ele, pelo mal-estar que as medidas provocaram entre prefeitura e Ministério Público. "Melhor interditá-la para evitar atropelamentos. É uma medida ruim, mas necessária", defende Bottura, consultor de engenharia urbana.
"Acho bom [o bloqueio] para evitar atropelamentos. Mas a medida é paliativa e afeta o trânsito", diz Afonso Celso Bueno Monteiro, presidente do CAU-SP (Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Estado de São Paulo).
Para Candido Malta, professor emérito da FAU-USP, a ação "pune" motoristas e moradores. "A Paulista não está preparada para receber essa grande quantidade de gente."
Já Valter Caldana, diretor da FAU-Mackenzie, avalia a iniciativa como positiva. "O que ocorreu no ano passado foi uma beleza. Isso é o cidadão ter prazer de perambular por onde ele mora", diz. "A avenida é um exemplo de desenho urbano, com prédios que permitem o uso público como o vão-livre do Masp, o escadão da Gazeta e o térreo do Conjunto Nacional."
Helene Afanasieff, professora da faculdade de arquitetura Escola da Cidade, afirma que as pessoas vão passear na Paulista porque lá se sentem parte da cidade. "É uma avenida para ver e para ser visto e um passeio favorecido por topografia e traçado."
Segundo os especialistas, a alternativa é eliminar por alguns dias e horários o tráfego de veículos. "Se nada for feito, já que a Paulista vai receber mesmo esses milhares de visitantes, é preciso recomendar paciência para quem for até lá, porque o trajeto será lento", diz Helene.
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"Não tenho nada contra [o Natal], mas contra a falta de organização. Nas outras datas [Réveillon, Parada Gay e São Silvestre], a cidade é avisada sobre as mudanças causadas pelos eventos", reclama o designer Gustavo Felipe Barbosa, 29. "O meu direito é 'cortado'. Não consigo chegar em casa por causa do trânsito, tenho que andar na rua porque as pessoas tomam as calçadas, não consigo dormir porque o barulho 'rola' até de madrugada", afirma ele, que vive há seis anos na Paulista.
A publicitária Heloísa Andrade, 43, moradora da alameda Jaú, nos Jardins, concorda. Ela acredita que a melhor solução é planejar o bloqueio da avenida. "Hoje, ninguém se irrita mais com a ciclofaixa porque todo mundo já sabe que vai ter parte da rua fechada e vai estar trânsito", diz ela, que aderiu à ciclofaixa no último domingo.
Em nota, a SPTuris diz que está alinhando os últimos detalhes do Natal Iluminado 2012. "A SPTuris irá apresentar à CET e à SPTrans todas as ações desta edição, incluindo uma atração na av. Paulista, para que os órgãos em questão possam realizar o seu planejamento para o trânsito."
A SPTrans diz que pode reforçar o número de ônibus ou mudar itinerários. Já o Metrô irá ampliar o número de trens (leia quadro ao lado). A vigilância será reforçada pela Polícia Militar e pela Guarda Civil Metropolitana.
ESPAÇO PARA TODOS
A pé, de carro ou de "bike", quem for à Paulista em dezembro se juntará a uma massa de pessoas com diferentes estilos. Em comum, todos, inclusive os natalinos, buscam entretenimento, serviços e segurança.
"A Paulista tem ganhado uma cara de corredor de serviços e comércio com uma relativa segurança, o que influencia na maneira como o pedestre se relaciona com o local", diz Afonso Celso Bueno Monteiro, da CAU-SP. Diante do 1,5 milhão de pessoas que circulam diariamente, em média, pela avenida, segundo a associação Viva Paulista, os edifícios se adaptaram.
"Os prédios perceberam que não era interessante manter um térreo ocioso", diz Maurício Stainoff, presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Estado de São Paulo. Prova disso é o edifício no número 1.765, que no ano passado transformou seu térreo em uma loja Marisa.
Ilustração Graphorama | ||
A Paulista é também destino de quem não quer gastar dinheiro. É o caso dos patinadores, que se reúnem em frente ao casarão de número 1.919. O grupo foi para lá há cerca de dez meses, por causa da reforma da marquise do Ibirapuera. "No início o pessoal reclamava, era como se ocupar esse espaço fosse uma ofensa", conta Wallace Gomes de Melo, 28.
Patinadores, skatistas e afins se tornaram mais frequentes na Paulista depois de concluída, no ano passado, uma série de melhorias, entre elas o deslocamento das faixas de pedestres dos cruzamentos, readequação do canteiro central, da iluminação pública e das calçadas. "A infraestrutura na Paulista, comparada com o restante da cidade, é um diferencial", afirma Candido Malta, da FAU-USP.
E a cada semana um novo "point" é ocupado. O mais recente fica na praça Oswaldo Cruz, perto do shopping Paulista. Ali, as calçadas lisas e os bancos conquistaram os skatistas iniciantes. "Aqui fica a galera que está começando. No prédio da Caixa, fica quem anda melhor", conta Thiago Ávila, 15.
Entre os que fazem da Paulista um local de trabalho, a movimentação do Natal é bem-vinda. Maria Angélica Xavier, 25, se apresenta como estátua viva desde o início deste ano e espera conquistar os turistas. "O meu público, as famílias, estará aqui. Penso em ficar até as 22h ou 23h", diz a artista, que trabalha entre 14h e 18h. Para ela e para muitos paulistanos, as noites de dezembro na Paulista serão longas.