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Serafina

Após 39 anos de 'Reggatta de Blanc', Sting lança novo disco de reggae

Beatrice de Gea/The New York Times
Ator e músico Sting está sentado numa poltrona vestindo uma camisa branca. Ele olha para a foto com o braço direito dobrado para cima, segurando o encosto do móvel.
Ator e cantor Sting, em Nova York
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Sting, 66, me faz a primeira pergunta: "Você é do Rio ou de São Paulo?". Depois cantarola "Aquarela do Brasil". "Sempre amei a música brasileira: Villa-Lobos, Jobim, Caetano, Gilberto. Amo o ritmo, a poesia. Bossa nova, para mim, é arte de alta qualidade. Pego emprestado da música brasileira o tempo todo", diz.

A primeira interação não bate com a imagem pública de arrogante que colou em Gordon Sumner, nome de batismo do ex-vocalista e baixista do grupo de rock The Police, um dos mais importantes dos anos 1970 e 1980.

A má fama foi alimentada ao longo dos anos por histórias como a de que ele foi o responsável pelas brigas que levaram ao fim de sua banda, em 1986. Ou por declarações orgulhosas como a de que ele e a segunda mulher, a produtora Trudie Styler, 64, faziam sexo por sete horas seguidas.

Casados desde 1992, os dois têm quatro filhos: Brigitte Michael, 34, Jake, 32, Eliot, 27, e Giacomo, 22. O cantor ainda tem mais dois -Joe, 43, e Fuchsia, 32 do seu primeiro casamento, com a atriz norte-irlandesa Frances Tomelty, 69, de quem se separou em 1984.

Colaborou também para certa desconfiança em relação ao cantor seu engajamento em questões ambientais, que críticos veem como ferramenta de autopromoção.

Em todo caso, apesar do testemunho suspeito, quem trabalha com ele jura que a impressão é equivocada. "Ele é educado, agradável, generoso, paciente e, ainda por cima, extremamente talentoso", descreve o argentino criado nos EUA Martin Kierszenbaum, seu agente há 27 anos.

"Sting é totalmente o oposto do retratado nos tabloides, não é nada arrogante, é muito pé no chão", afirma o ex-baterista do Police, Stewart Copeland, que concordou em falar à Serafina sobre o ex-parceiro.

Beatrice de Gea/The New York Times
Ator e músico Sting está sentado numa poltrona vestindo uma camisa branca. Ele olha para a foto com o braço direito dobrado para cima, segurando o encosto do móvel.
Músico Sting, 66

Nos tempos de banda, os conflitos entre os dois se tornaram famosos -em um deles, Sting teria saído com uma costela quebrada. "Na verdade, ele é muito tímido. Ele é o melhor no que faz, e, mesmo assim, é tímido. Simples assim. Não consegue jogar conversa fora e acaba passando por arrogante. Aprendi muito sobre humildade com Sting".

Por que então o contraste entre sua persona pública e a opinião de quem convive com o cantor? "Bom, aí você precisa falar com os inimigos dele", diverte-se Copeland.

Inimigos? E quem seriam? "O Bono [vocalista do U2]!", revela o baterista. "Não sei qual é o problema, mas eles não se dão bem. Talvez porque o Bono seja como eu, muito barulhento. É daquelas pessoas que gostam de dar tapinhas nas costas de todo mundo. Já Sting é quieto e profundo".

Volta ao reggae

Desde que saiu do Police, Sting teve uma carreira solo que ele classifica como "esotérica". Dedicou-se ao jazz, mas também ao pop, fez trilhas para filmes, compôs um musical, ganhou 16 Grammys, um Emmy, um Globo de Ouro.

Foi indicado quatro vezes ao Oscar (por músicas de "A Nova Onda do Imperador", em 2001; "Kate & Leopold", em 2002; "Cold Mountain", em 2004; e "Jim: A História de James Foley", 2016) e uma vez ao Tony, prêmio de teatro, pelo musical "The Last Ship" (o último navio), em 2017. Seu último álbum, "57th and 9th", de 2016, foi um retorno ao rock.

A entrevista com Sting acontece em uma igreja construída no norte de Londres no fim do século 18. Ao seu lado está o jamaicano Shaggy, 49, autor de hits dos anos 1990, como "Boombastic" e "It Wasn't Me", e parceiro do próximo trabalho, o álbum "44/876", a ser lançado em abril. Os números do título correspondem aos códigos telefônicos do Reino Unido e da Jamaica.

Este álbum, portanto, revisita o reggae jamaicano, um dos gêneros que mais influenciaram sua música nos tempos de The Police. O segundo álbum da banda, de 1979, se chama "Reggatta de Blanc". E foi na ilha caribenha, diz Sting, que compôs seu maior hit, "Every Breath You Take".

Reggatta de Blanc - The Police

"44/876" surgiu após Sting ser convidado para gravar um refrão para uma música de Shaggy. Ficaram amigos, acharam que as vozes combinaram e decidiram compor um disco todo.

Uma caneca de rum

Nos meses seguintes, passaram a se reunir regularmente em Nova York com outros músicos -o trompetista americano Branford Marsalis foi um dos que gravou uma participação- em meio a muito rum misturado com Ting, um refrigerante jamaicano.

O single "Don't Make Me Wait" foi lançado no começo do ano em um show em Kingston, capital da Jamaica. Depois do lançamento do disco, os dois farão uma turnê.

O contraste entre a personalidade dos dois é evidente. O jamaicano é agitado, fala alto, faz piadas, trocadilhos e conta histórias sem parar. O britânico é simpático, mas mais econômico nas palavras.

"O processo do Shaggy ao compor é muito diferente do meu; ele é muito espontâneo. Então me forçou a fazer o mesmo", diz o inglês. "Por outro lado, eu o forcei a ser um pouco mais cuidadoso, mais meticuloso".

Diz Shaggy: "As músicas vão viver mais do que a gente. O Sting é um cara que nunca lançou uma canção com a qual não estivesse satisfeito. Já eu, oras, tem uma ou outra música que eu fiz por aí que não me fazem muito feliz [risos]".

Ironicamente, o incômodo de Sting com a espontaneidade de Stewart Copeland foi um dos motivos pelos quais o Police acabou.

"Quando Sting está cantando, ele quer uma base segura, quer que a banda faça exatamente o que precisa. E eu sou o cara errado pra isso, nunca toco uma música do mesmo jeito e isso deixava ele maluco. E eu ficava maluco com ele me dizendo pra tocar sempre da mesma forma", lembra Copeland.

Beatrice de Gea/The New York Times
Ator e músico Sting está sentado numa poltrona vestindo uma camisa branca. Ele olha para a foto com os dois braços dobrados para cima, segurando a sua cabeça.
Sting, ex-vocalista e baixista do The Police

O baterista gosta de dizer que foi ele quem "descobriu" Sting. O inglês trabalhava como professor de uma escola em Newcastle, no nordeste da Inglaterra, e tocava em uma banda de jazz chamada Last Exit, quando Copeland viu seu show e o convidou em 1976.

Hoje, eles dizem ter um bom relacionamento, mas não pensam em voltar a fazer shows juntos. A última apresentação foi na turnê mundial de 2007-2008, que passou por 29 países, inclusive o Brasil, arrecadou US$ 212 milhões e vendeu quase 2 milhões de ingressos.

"The Police é como um terno Prada feito de arame farpado. Bem legal, mas nada confortável", resume elegantemente Copeland.

Política dos EUA

O tom do novo disco é leve e animado, mas, como em "57th and 9th", a política ganha algum espaço. A faixa mais engajada é "Dreaming in the USA".

"É uma referência pouco sutil à situação horrenda dos dreamers", explica o inglês, referindo-se ao grupo de residentes dos EUA que chegaram ilegalmente no país quando ainda eram crianças e hoje enfrenta risco de deportação pelo governo de Donald Trump.

"Há muita escuridão na política hoje; políticos tentando nos dividir de um jeito que não é saudável. É importante fazermos algo juntos e dar esperanças para as pessoas em tempos como estes. Então, é um disco divertido, mas com uma intenção séria. Como britânico, sempre vi os Estados Unidos como o sonho, a promessa de esperança. Isso não pode se inverter", afirma.

Ayahuasca no Brasil

O ativismo ambiental, talvez tanto quanto a música, aproximou Sting do Brasil. O primeiro capítulo de sua autobiografia "Broken Music - A Memoir" (Sting- Fora do Tom, publicada em 2006 pela Cosac Naify no Brasil), se passa no Rio de Janeiro, quando ele e Trudie experimentaram chá de ayahuasca durante uma visita à cidade em 1987.

Naquele mesmo ano, Sting foi apresentado ao cacique Raoni Metuktire, com quem depois viajaria por diversos países para chamar atenção para o desmatamento.

Sob sua inspiração, o músico fundou a ONG Rainforest Foundation, cujo objetivo é defender a preservação de florestas tropicais e demarcação de territórios para as populações nativas. Em 2009, Sting e Raoni se reencontraram para protestar contra a construção da usina de Belo Monte.

Ganhou reconhecimento por sua militância e prêmios -o mais recente foi concedido no ano passado pelo respeitabilíssimo Smithsonian Institution, dos EUA-, mas também foi acusado de hipocrisia, como quando fez um show na festa da filha de um ditador do Uzbequistão, em 2010.

Beatrice de Gea/The New York Times
Ator e músico Sting está sentado numa poltrona vestindo uma camisa branca. Ele olha para a foto com o braço direito dobrado para cima, segurando o encosto do móvel.
Ator e músico Sting, 66

Sting mantém o discurso ambientalista e critica o que vê como retrocessos recentes, como o protagonismo que céticos da mudança climática ganharam sob o governo de Trump.

"É ridículo. Todo mundo sabe que o aquecimento global é real; ninguém nega seriamente. Todo ano, mais e mais provas se acumulam. Políticos ainda não acordaram para isso, mas precisam fazê-lo, tenho falado isso há anos. O ar e os oceanos estão ficando mais poluídos, florestas estão desaparecendo, está ficando mais quente. É hora de fazer algo".

Aos 66 anos, o cantor diz que a cabeça mudou pouco com a idade. Mas admite que pensa cada vez mais na morte, especialmente depois que amigos como David Bowie e Prince faleceram.

"Idade é só um número. Me sinto como se tivesse 14 anos na maior parte do tempo. Ainda tenho muita curiosidade sobre o porquê estamos aqui e acho que isso mantém a mente jovem. E, sim, penso mais na morte conforme me aproximo dela. Mas não com medo, e sim com curiosidade".

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